quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

França : A prática dos partidos satélites para contornar a lei de financiamento dos partidos


            O ano de 2010 na França foi marcado por um escândalo financeiro com repercussão no campo do financiamento eleitoral. A bilionária francesa Liliane Bettencourt, acionista do grupo L’Oréal, a segunda pessoa mais rica da França e uma das mais ricas do mundo, é suspeita de sonegar impostos e fazer doações eleitorais ilícitas. Liliane teria sido ajudada na ocultação da sonegação pelo ex-ministro do Trabalho da França, Eric Woerth. O ministro é casado com Florence Woerth, executiva de um escritório que gerenciava a fortuna da empresária. O escândalo teve início com a revelação de escutas clandestinas. Em seguida uma ex-contadora de Liliane confirmou numa entrevista que Eric Woerth, na qualidade de tesoureiro da campanha à presidência de Sarkozy, teria recebido na mansão de Liliane em Neuilly-sur-Seine um envelope com 150.000 euros em espécie destinados a financiar a campanha. Woerth nega as acusações, que estão sendo investigadas.
            Confirmadas ou não, as suspeitas reabriram o debate na França sobre a disciplina do financiamento privado dos partidos políticos. É que uma manobra astuciosa para contornar as disposições da lei de financiamento partidário foi revelada no contexto do escândalo Woerth-Bettencourt. As escutas revelaram que a bilionária havia multiplicado as doações ao partido presidencial e a micro-partidos criados por ministros do governo.
A Lei nº 88-227, de 11 de março de 1988, veda as contribuições das pessoas jurídicas aos partidos, fixa um teto para as contribuições das pessoas físicas e limita as doações em espécie. Há uma brecha, porém : os partidos políticos podem fazer doações entre si sem limites. A prática é legal, e vantajosa, porque de acordo com o art. 11-4 da referida lei, as doações consentidas por pessoa física devidamente identificada a um mesmo partido político não podem exceder anualmente o valor de 7.500 euros. Sendo assim, a lei não impede que ricos simpatizantes doem uma vez ao partido, depois uma segunda, terceira, quarta, ou décima vez aos micro partidos satélites, que repassam os valores ao partido principal.
Em 1990 os partidos satélites eram 28, e passaram a 255 em 2004, segundo a Comissão Nacional das Contas de Campanha e dos Financiamentos Políticos (CNCCFP). A UMP, partido político do presidente Sarkozy, é que utiliza mais amplamente essa manobra. O orçamento total dos satélites do partido presidencial chega a 4.938.451 euros. Uma soma em muito superior à do conjunto dos partidos próximos ao PS, partido de oposição, cujos orçamentos somados chegam a 796.964 euros.
A CNCCFP denuncia a utilização do sistema e pede uma reforma desde 1995.