sábado, 4 de dezembro de 2010

Ainda o financiamento eleitoral

Causa indignação que no Brasil – um dos países campeões da desigualdade social – os governantes recém-eleitos já comecem o mandato sob o peso de obrigações que nada têm a ver com os direitos do povo mais pobre e sofrido, mas sim com os interesses particulares de agentes econômicos poderosos. Isto se deve às brechas e deficiências da nossa disciplina do financiamento eleitoral. Empreiteiras, bancos e outras grandes empresas deveriam ser excluídas por lei do financiamento de partidos e campanhas. Nestes dias em que as contas de campanha da presidente eleita Dilma Rousseff estão sendo julgadas pela Justiça Eleitoral, o tema está na ordem do dia, suscitando manchetes diárias nos jornais, e exige mobilização urgente da sociedade civil organizada, para mudar radicalmente o modo de financiar campanhas nas futuras eleições.

Leia : 


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 Folha de S.Paulo, 4 de dezembro de 2010

Opportunity doou R$ 1,5 milhão ao PT

Foi a primeira vez, ao menos desde 2002, que o grupo de Daniel Dantas deu dinheiro para campanha eleitoral

Banqueiro foi condenado em 1ª instância sob acusação de corrupção na Operação Satiagraha; ele recorreu da decisão 

FERNANDA ODILLA
RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA 

Condenado em primeira instância na Justiça Federal por suposta corrupção na Operação Satiagraha, em 2008, o banqueiro Daniel Dantas doou, por meio de suas empresas, R$ 1,5 milhão para o diretório nacional do PT nas eleições.
É a primeira vez desde pelo menos 2002, quando a Justiça Eleitoral passou a divulgar as doações pela internet, que o banco Opportunity aparece na lista de financiadores de campanhas do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
As doações ao PT ocorreram por meio de três fontes: o banco e suas empresas Opportunity Gestora e Opportunity Lógica, sediadas no mesmo endereço no Rio.
Os repasses ocorreram no mês de setembro, antes do primeiro turno das eleições.
Como o dinheiro entrou no caixa único do partido, por "doação oculta", não é possível saber para qual campanha ele foi direcionado.
Pela lei, os partidos podem repassar os recursos para quaisquer candidatos e partidos de sua coligação.
A prática, legal, se vale de uma brecha na lei que permite aos doadores não relacionarem suas contribuições aos candidatos.
Neste ano, o PT nacional recebeu R$ 130,5 milhões e repassou mais de 99% a candidatos e partidos aliados, como o PSC -destinatário de R$ 4,7 milhões, que declarou apoio a Dilma Rousseff às vésperas da campanha.
Em julho de 2008, Daniel Dantas e outros executivos do grupo Opportunity foram presos duas vezes pela Polícia Federal, no decorrer da Operação Satiagraha, e foram soltos em seguida por decisões do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Gilmar Mendes.
As decisões foram confirmadas pelo plenário do STF.
Em dezembro daquele ano, o juiz da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, Fausto Martin de Sanctis, condenou Dantas a dez anos de prisão por suposto suborno de policiais federais que comandavam a Satiagraha.
Dantas nega a acusação. Seus advogados disseram na época da condenação que "não houve o crime atribuído", a defesa foi "cerceada" e "as provas são fraudadas".
O Opportunity recorreu em diversas instâncias e conseguiu uma decisão do TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região que, na prática, impediu que De Sanctis julgue o processo principal originado da Satiagraha.
O banco também recorre da condenação do caso de suposto suborno.

HISTÓRICO DAS RELAÇÕES
Em abril de 2008, o Opportunity selou um amplo acordo com os fundos de pensão ligados às empresas estatais, seus parceiros na companhia telefônica Brasil Telecom.
Pelo acordo, os dois lados abriram mão de continuar discutindo judicialmente diversos processos em andamento, como os que tratavam de supostas irregularidades praticadas pelo comando do Opportunity.
O acordo antecedeu a venda da Brasil Telecom para a Oi, o que originou a chamada Supertele. O presidente Lula assinou, em novembro de 2008, um decreto que criou as condições legais para a venda da BrT.
Em paralelo a isso, o BNDES injetou R$ 2,6 bilhões em empréstimos para a Oi, o que possibilitou a transação entre as teles.
Banco afirma que doação é legal; PT não vê problema      

DE BRASÍLIA 

O banco Opportunity disse apenas que as doações de R$ 1,5 milhão feitas ao PT respeitaram a legislação.
Em resposta a perguntas encaminhadas pela Folha, o Opportunity não explicou se houve um pedido do PT ou se as doações foram iniciativa do banco. Também não esclareceu o motivo pelo qual outros partidos deixaram de ser atendidos.
O secretário de Comunicação do PT, deputado André Vargas (PR), afirmou não ver problemas nem constrangimentos na doação. "Nós só podemos receber doação de quem tem dinheiro. Desde que seja legal, contabilizada, não há problema."
Ele não soube informar se a iniciativa partiu do grupo ou se foi o partido que procurou o Opportunity.
(FO e RV)