domingo, 9 de dezembro de 2018

Brasil: MCCE vence o Innovare 2018


Leia notícia publicada em 06.12.2018 no site do MCCE:


Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) vence o prestigioso Prêmio Innovare 2018 na categoria Justiça e Cidadania.

Brasília/DF –  Concorrendo com mais de 200 práticas de todo o Brasil na categoria “Justiça e Cidadania”, o MCCE recebeu na manhã desta quinta-feira (6/12), no Salão Branco do Supremo Tribunal Federal (STF), o Prêmio Innovare 2018.
Considerada a mais importante premiação da Justiça Brasileira, o Innovare reconhece, há 15 anos, práticas transformadoras que se desenvolvem na Justiça do Brasil. Além do reconhecimento, o Prêmio ainda busca a identificação de ações concretas que tenham realizado transformações relevantes que sejam exemplos a serem implantadas pelo País.
Para o codiretor e cofundador do MCCE, Luciano Santos, o Innovare é um importante de reconhecimento do trabalho realizado pela parceria do MCCE com o APPCívico e por várias outras organizações. “Receber um prêmio para o MCCE é sempre uma alegria porque é um trabalho de voluntários, de pessoas abnegadas, que batalham pelo combate à corrupção eleitoral no Brasil inteiro. Este prêmio é uma homenagem a todas as pessoas que colaboram com o MCCE”, registrou Santos.
Carlos Moura, codiretor e cofundador do MCCE, ressaltou que a premiação do Innovare ao MCCE traduz para todo o Movimento o sentimento do dever cumprido e de avanço no combate à corrupção eleitoral pelo Movimento.
Miguel Ângelo, codiretor do Movimento, destacou que “ganhar o Prêmio é uma grande honra porque vem de muito trabalho e muita dedicação. É um merecimento por nosso trabalho. Parabéns ao MCCE, a toda nossa rede de entidades e a todos que contribuíram por essa conquista.”
Representando o APPCIVICO, Thiago Rondon, disse que “o Innovare de 2018 foi para o MCCE e para o APPCIVICO muito importante porque o projeto vem trazendo propósito para as tecnologias que estão surgindo, no sentido de controle social, transparência, combate à corrupção. Isso é muito gratificante, assim como poder compartilhar, espalhar melhor essas ideias”, completou Rondon.

Voto Legal
A plataforma de arrecadação de doações eleitorais Voto Legal foi idealizada pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), organização que criou a lei Ficha Limpa (LC nº 135/10), e a empresa de tecnologia APPCívico. A plataforma atuou nas eleições de 2016 e 2018 com o objetivo facilitar a doação para campanhas eleitorais com transparência no exercício da cidadania, utilizando blockchain.
O impacto da construção da plataforma foi a ampliação do debate sobre financiamento coletivo de campanhas eleitorais junto ao TSE, Ministério Público e organizações da sociedade civil.
Saiba + em Voto Legal.

terça-feira, 27 de novembro de 2018

Brasil: TSE reafirma entendimento sobre inelegibilidade por doação acima do limite


Leia notícia publicada em 22.11.2018 no site do TSE:

Para ministros da Corte, candidato fica inelegível quando a doação compromete o resultado das eleições

Por maioria de votos, o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, na manhã desta quinta-feira (22), que o deputado federal Alcides Filho (PP-GO), eleito em 2018, não estava inelegível com base na alínea 'p' da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010) quando concorreu ao cargo. Ele respondia a uma ação judicial por doação acima do limite previsto em lei durante a campanha de 2014, ano em que se candidatou a vice-governador de Goiás pelo Partido Social Cristão (PSC).
Com a decisão, os ministros do TSE reafirmaram o entendimento da Corte no sentido de que a inelegibilidade só fica caracterizada quando o valor doado compromete o resultado das eleições. No início de novembro, o Tribunal já havia decidido de modo semelhante, quando anulou a inelegibilidade do candidato a deputado federal por São Paulo Eduardo Peres (PV). Na ocasião, prevaleceu a tese, assentada na jurisprudência da Corte, de que se deve avaliar, caso a caso, se o valor em excesso comprometeu o resultado das eleições.
No caso de Alcides Filho, a doação, no valor de R$ 250 mil, partiu da faculdade de propriedade de sua família. O montante foi destinado à campanha para governador na chapa em que o próprio Alcides Filho era candidato a vice.
Voto do relator

Ao proferir seu voto, o relator do processo, ministro Og Fernandes, afirmou que a incidência da alínea 'p' exige um juízo de proporcionalidade da doação reputada como ilegal. Ele lembrou que, no caso em análise, a pessoa jurídica dirigida pelo candidato recorrido foi condenada por doação acima do limite legal, mas que os valores doados representam apenas 5,5% do total arrecadado pela campanha. No entender do magistrado, houve baixa interferência das cifras doadas nas Eleições de 2014, uma vez que a candidatura beneficiada nem sequer chegou ao segundo turno do pleito.
“Se comparada à campanha da chapa eleita, o valor irregular representa 0,98% do total amealhado pela campanha da chapa eleita”, disse Og Fernandes. De acordo com o ministro, “é desproporcional afixar ao recorrido a grave consequência da inelegibilidade por conduta que, concretamente, não atingiu os valores constitucionais subjacentes à hipótese de incidência, notadamente em virtude de o excesso ter representado a quantia reduzida do montante total arrecadado”.
O voto do relator foi acompanhado pela maioria formada pelos ministros Admar Gonzaga, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Alexandre de Moraes e Jorge Mussi.
Divergência

Votaram de modo divergente o ministro Edson Fachin e a presidente do TSE, ministra Rosa Weber. Ambos se manifestaram no sentido de dar provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral (MPE) e confirmar a inelegibilidade do deputado Alcides Filho.
De acordo com a tese defendida pelo ministro Fachin, que abriu a divergência, a determinação prevista na alínea 'p' não permite uma “latitude hermenêutica” para inferir se o excesso de doação afetou ou não o pleito. Em outras palavras, a simples comprovação de doação acima do limite permitido por lei já é motivo para resultar na inelegibilidade.
“A quantia de dinheiro em si aferida já é expressiva e suficiente para a prática de quantidade de atos de campanha eleitoral aptos a influenciar a normalidade do pleito”, argumentou Fachin, ao lembrar ainda que a faculdade responsável pela doação apresentou faturamento bruto zerado em 2013. Na ocasião das Eleições 2014, a legislação eleitoral ainda permitia a doação por pessoas jurídicas, desde que não ultrapassasse 2% do faturamento bruto do ano anterior às eleições.
CM/RT, DM
Processo relacionado: RO 060102696

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

França: Decreto fixa montante do financiamento público dos partidos em 2018; dois são punidos por desrespeito à paridade


Assim como no Brasil, na França os partidos políticos recebem a cada ano uma subvenção do Estado. Na França essa subvenção é dividida em duas frações: uma primeira fração fixada em função do número de votos obtidos no primeiro turno da eleição para a Câmara dos Deputados (Assemblée Nationale), contanto que os partidos tenham respeitado suas obrigações contábeis.
A lei prevê uma cláusula de barreira para o recebimento, pelos partidos, dessa primeira fração (que é proporcional ao número de votos e não exige que os candidatos tenham sido eleitos): é preciso que os candidatos do partido tenham obtido pelo menos 1% dos votos em pelo menos 50 circunscrições (considerando que o sistema é majoritário uninominal – distrital –, e que existem 577 circunscrições, cada uma elegendo um deputado).
Essa primeira fração é minorada para as formações políticas que não respeitaram a obrigação de paridade entre homens e mulheres nas candidaturas para a Câmara dos Deputados. Assim, quando a diferença numérica entre os candidatos de cada sexo à Câmara dos Deputados ultrapassa 2% do número total de candidatos de um partido, o montante da primeira fração atribuída a esse partido é diminuído de 150% dessa diferença, mas sem que essa diminuição possa exceder o montante total da primeira fração (Lei nº 88-227, de 11 de março de 1988, art. 9-1).
A segunda fração é fixada em função do número de parlamentares (deputados e senadores) eleitos – destina-se especificamente aos partidos e agrupamentos políticos representados no Parlamento (Lei nº 88-227, de 11 de março de 1988, art. 8; decreto nº 2016-111, de 4 de fevereiro de 2016).
Em 11 de outubro, foi editado o decreto que fixa o montante do financiamento público a que os partidos políticos fazem jus em 2018.
            Em 2018, esse montante foi de 66.190.460,49 euros.
            O partido do presidente Emannuel Macron, La République en Marche, recebeu a maior fatia: 22,5 milhões de euros, mais de um terço do total.  
Apenas dois partidos foram punidos por desrespeito à obrigação de paridade: O partido Les Républicains, que teve retidos quase 1,8 milhões de euros, porque apresentou 278 candidatos e apenas 182 candidatas; e o partido France Insoumise, que teve retidos 252.517,99 euros, porque apresentou 285 candidatos e apenas 262 candidatas.
Na França, a obrigação de paridade tem tendido a ser cada vez mais respeitada pelos partidos; em 2017, a porcentagem de mulheres eleitas para a Câmara dos Deputados (Assemblée Nationale) chegou a 40%.

Referências:
BOUDET, Alexandre. Législatives: les partis que perdent des subventions à cause du non-respect de la parité. Le HuffPost, 12 out. 2018. Disponível em : <https://www.huffingtonpost.fr/2018/10/12/legislatives-les-partis-qui-perdent-des-subventions-a-cause-du-non-respect-de-la-parite_a_23559183/>. Acesso em : 26 nov. 2018.

X., Aide publique aux partis politiques: 66 millions d’euros en 2018. Vie Publique, 17 out. 2018. Disponível em : <http://www.vie-publique.fr/actualite/alaune/aide-publique-aux-partis-politiques-66-millions-euros-2018.html>. Acesso em: 26 nov. 2018.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Brasil: Senador desiste de projeto que fragiliza Lei da Ficha Limpa; proposta será arquivada


Leia notícia publicada ontem no site G1:

  
Por Gustavo Garcia, G1 — Brasília


Texto contraria decisão do STF que determinou inelegibilidade de oito anos para políticos condenados antes de 2010, quando a Ficha Limpa passou a vigorar.

O senador Dalirio Beber (PSDB-SC), autor de projeto que fragiliza a Lei da Ficha Limpa, anunciou nesta terça-feira (20) a decisão de retirar a proposta de tramitação.
A solicitação do parlamentar foi aprovada pelo plenário e, com isso, o projeto será arquivado.
O projeto estava em regime de urgência, mas foi alvo de críticas de vários senadores. Os parlamentares contrários afirmam que o projeto “flexibiliza” a Lei da Ficha Limpa por diminuir o período de inelegibilidade para políticos condenados antes de 2010.
Dois senadores apresentaram pedidos de retirada da urgência do projeto. No entanto, antes da análise dos pedidos, Dalirio Beber subiu à tribuna e anunciou a retirada da proposta:
“Decido, então, portanto, retirar o PLS 396/2017. Certo que jamais quis criar tamanha celeuma nem tampouco causar constrangimento aos meus pares. Não havendo o desejo desta Casa, da sociedade e, especialmente, da população do estado de Santa Catarina na apreciação desta matéria, peço o apoio dos nobres colegas para que retiremos essa proposta.”
O texto foi apresentado por Dalírio Beber em outubro de 2017, dias depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter decidido que políticos condenados antes de 2010 deveriam cumprir oito anos de inelegibilidade, e não três, como ocorria anteriormente.
Na época, o tribunal discutia se a punição determinada pela Lei da Ficha Limpa, que entrou em vigor em 2010, valeria também para casos anteriores a essa data. Por maioria de seis votos, os ministros entenderam que sim.
Pelo texto de Beber, os políticos que cumpriram os três anos de inelegibilidade já estariam aptos a concorrer novamente em eleições.
Em dezembro de 2017, sete líderes de partidos no Senado apresentaram um requerimento para que o projeto passasse à frente de outros e fosse votado com urgência. O requerimento ficou meses parado.
Só em novembro de 2018 é que a urgência foi aprovada e o projeto entrou na pauta de votação.

'Objetivo não foi desfigurar lei'

 

Em discurso na tribuna do Senado, o senador Dalirio Beber afirmou que o objetivo da proposta não foi “desfigurar” a Lei da Ficha Limpa.
“O objetivo desse projeto não foi desfigurar a Lei da Ficha Limpa, projeto com origem na iniciativa popular, que sempre contou com meu respeito e apoio”, afirmou Dalirio.
Segundo o tucano, a intenção era preencher uma “lacuna” deixada pelo Poder Legislativo em relação à retroatividade da Lei da Ficha Limpa, que gerou “insegurança jurídica”.
Ele disse ainda que a iniciativa nunca foi “desrespeitosa” ao STF e afirmou que na própria Corte houve divergências sobre o alcance da legislação.
“Entendi que, tendo em vista opiniões contraditórias, distintas dentro do próprio Judiciário, que era importante o Legislativo se manifestar no sentido de esclarecer se a retroatividade deveria ser considerada”, afirmou Beber.


Críticas

 

Antes do discurso de Dalirio Beber, vários parlamentares criticaram a proposta.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que apresentou um dos pedidos de retirada da proposta da pauta de votações, disse que o texto é uma tentativa do Congresso em dar um “jeitinho” na Lei da Ficha Limpa.
"[O projeto] abre uma porta inteira. Ele, na verdade, dá um jeitinho na Lei da Ficha Limpa. É um jeitinho para beneficiar condenados anteriormente a 2010. É a vulnerabilização da Lei da Ficha Limpa. É para beneficiar condenados a concorrerem nas próximas eleições", afirmou.
Randolfe afirmou ainda que seu gabinete fez um levantamento parcial sobre quantos políticos poderiam se beneficiar caso a proposta virasse lei.
“Nós estimamos, uma estimativa do meu gabinete, algo em torno de 200 prefeitos e vereadores. Algo em torno disso que poderiam [ser beneficiados]. Mas eu não tenho uma análise mais detida de parlamentares do Congresso Nacional, de outros detentores de mandatos que poderiam ser beneficiados com o projeto”, afirmou o parlamentar do Amapá.
O senador Romero Jucá (MDB-RR) também anunciou posicionamento contrário à proposta.
“O partido [MDB] está contra esse projeto, porque entendemos que não é a forma, não é a hora, não é o momento. Essa discussão pode até ser feita em outro momento para discutir como avaliar esses procedimentos, mas nunca em um momento como este, dessa forma”, disse.
Simone Tebet, líder do MDB no Senado, disse que o texto é “inoportuno” e “inócuo”.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Brasil: Por que a Lei das Inelegibilidades não contempla o caso do presidente da República afastado do cargo ? Origem histórica e sentido da inabilitação


Causa estranheza para muitos o fato de a Lei das Inelegibilidades (LC nº 64/1990) omitir a perda de mandato pelo presidente da República como causa de inelegibilidade. Nas palavras de Tito Costa, “o Presidente e o Vice-Presidente da República ficaram excluídos do rol desse tipo de inelegibilidade, o que não deixa de ser estranho, pois representa um tratamento diferenciado, por parte do legislador, em relação ao ocupante do mais alto posto eletivo do país” (2004, p. 222).   
De fato, as consequências jurídicas da perda do cargo público por infringência da Constituição não são tratadas pela ordem jurídica brasileira nos mesmos termos se quem perde o cargo é o presidente da República ou se são os governadores, prefeitos e parlamentares nas três esferas.
 Governadores, prefeitos e parlamentares que perdem seus cargos por infringência de determinados preceitos da Constituição Federal, ou de Constituições Estaduais ou de Leis Orgânicas municipais, conforme o caso, tornam-se inelegíveis por oito anos, por força do disposto na Lei das Inelegibilidades (Lei Complementar nº 64/1990, art. 1º, I, b e c).
Porém, a LC nº 64/1990 silencia quanto ao presidente da República. A razão de ser dessa omissão é que as consequências da perda de mandato pelo presidente da República estão previstas na própria Constituição.
De acordo com a cláusula de imunidade penal temporária contida no art. 86, § 4º, da Constituição, o presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.
Já certas condutas praticadas pelo presidente no exercício de suas funções podem vir a ser qualificadas como crimes de responsabilidade.
Como assinalam Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Junior (2010, p. 354), os crimes de responsabilidade não são crimes, em sentido próprio, mas, na verdade, constituem infrações político-administrativas, cuja incidência enseja o chamado processo de impeachment.
     De acordo com o art. 85 da Constituição, são crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: I - a existência da União; II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação; III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; IV - a segurança interna do País; V - a probidade na administração; VI - a lei orçamentária; VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
O parágrafo único desse artigo estabelece que esses crimes devem ser definidos em lei especial, que deve estabelecer as normas de processo e julgamento. Até o presente momento, essas matérias são ainda regidas pela Lei nº 1.079/1950.
A Constituição de 1988 estabelece que o Senado é competente para processar e julgar o presidente e o vice-presidente da República nos crimes de responsabilidade (art. 52, I), caso em que funcionará como presidente do Senado o do STF, “limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis” (grifo nosso, art. 52, parágrafo único).
      Essa previsão é tradicional em nosso direito, e em suas origens foi praticamente copiada da Constituição norte-americana de 1787.
A Constituição norte-americana de 1787, no art. I, seção 3, que trata do Senado, estabelece que: “Judgment in cases of impeachment shall not extend further than to removal from office, and disqualification to hold and enjoy any office of honor, trust or profit under the United States: but the party convicted shall nevertheless be liable and subject to indictment, trial, judgment and punishment, according to Law”.
Em tradução livre: “O julgamento em caso de impeachment não deve se estender além da destituição do cargo, e da desqualificação para ocupar e exercer qualquer cargo de honra, confiança ou lucro nos Estados Unidos: mas o condenado deverá todavia ser responsabilizado e sujeito a acusação, processo, julgamento e punição, de acordo com a Lei”.
    Na primeira Constituição republicana brasileira, de 1891, estava estabelecido no Capítulo III, que tratava do Senado, que competia ao Senado julgar o presidente da República, nos termos e pela forma por ela prescritos, não podendo “impor outras penas mais que a perda do cargo e a incapacidade de exercer qualquer outro sem prejuízo da ação da Justiça ordinária contra o condenado” (art. 33, § 3º).
      Depois da Constituição de 1891, as Constituições brasileiras que se seguiram continham disposições semelhantes (1934, art. 57, § 7º; 1937, art. 86, § 1º; 1946, art. 62, § 3º; 1967, art. 44, parágrafo único; 1969, art. 42, parágrafo único).
Previsão similar foi mantida, como visto, na Constituição de 1988 (art. 52, parágrafo único).
O que se passou então, quando da elaboração da LC nº 64/1990, é que o legislador complementar sequer cogitou tratar da inelegibilidade do presidente da República que haja perdido o mandato por crime de responsabilidade. Apenas, posteriormente, em 2010, a Lei da Ficha Limpa previu a inelegibilidade daquele que renuncia ao mandato para evitar o impeachment (alínea k do art. 1º, I, da LC nº 64/1990).
Isso seguramente por ter o legislador complementar considerado que a matéria já estava devidamente disciplinada na Constituição Federal, que ao prever a inabilitação por oito anos já excluía o ex-presidente da possibilidade de se candidatar a cargos eletivos durante esse período.
 Do exame da tramitação no Congresso do projeto de lei que deu origem à LC nº 64/1990 observa-se que não se cogitou de incluir o impeachment do presidente da República entre as hipóteses de inelegibilidade: A LC nº 64/90 foi originária do Projeto de Lei do Senado nº 21/1990 (Complementar), de autoria do senador Jarbas Passarinho [1]. Esse Projeto de Lei já não previa a inelegibilidade do presidente da República que haja perdido o mandato; aliás nem mesmo a dos governadores e prefeitos – apenas a dos membros do Poder Legislativo[2]. O projeto teve parecer favorável da Constituição de Constituição, Justiça e Cidadania, na forma do substitutivo apresentado pelo senador Francisco Rollemberg. Esse substitutivo previa a inelegibilidade “dos membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas, da Câmara Legislativa e das Câmaras Municipais que hajam perdido os respectivos mandatos”; e também do “Governador e o Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, o Prefeito e o Vice-Prefeito que perderam seus cargos eletivos”[3]. Esse formato foi mantido no Parecer nº 94, de 1990 da Comissão Diretora, que apresentou a redação do vencido para o turno suplementar do substitutivo ao PLS 21/1990[4], e no Parecer nº 95, de 1990, da Comissão Diretora, que apresentou a redação final do PLS 21/1990. E foi mantido no texto final da Lei Complementar nº 64/1990 (alíneas b e c do art. 1º, I).
A interpretação que tem prevalecido, e que é coerente com a referida origem histórica do dispositivo, embora não seja unânime, é a de que a inabilitação é mais restritiva de direitos do que a inelegibilidade. Enquanto a inelegibilidade excluiria o indivíduo unicamente da candidatura a cargos eletivos, a inabilitação vedaria o exercício de todas as funções públicas, incluídos aí, além dos cargos eletivos, os cargos de provimento efetivo (por concurso público) ou em comissão (de livre nomeação e exoneração), e os empregos públicos (nas empresas públicas, regidos pela CLT).
            Araújo e Nunes Junior (2010, p. 354) reforçam esse entendimento ao afirmar que a teor do art. 52, parágrafo único, da Constituição, “o presidente da República deve ser afastado do cargo, bem como impossibilitado de ocupar o mesmo ou qualquer outro cargo público pelo período de oito anos”.
Como se sabe, na história recente do nosso país, o desfecho do processo que levou ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff seguiu um rito discrepante da letra expressa da Constituição em matéria de inabilitação. De fato, durante o processo de impeachment, o presidente do STF, no exercício da função de presidente do Senado, deferiu um pedido de destaque, e desmembrou em duas a votação final do impeachment. Assim, foram votadas separadamente a cassação propriamente dita e a inabilitação, o que resultou no impeachment de Dilma Rousseff mas na rejeição da pena de inabilitação, o que permitiu a ela manter o direito de ocupar cargos públicos.



Referências:


ARAÚJO, L. A. D.; NUNES JUNIOR, V. S. Curso de direito constitucional. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

COSTA, T. Recursos em matéria eleitoral. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.



[1] Senado Federal. Secretaria de Informação Legislativa. Disponível em: <http://legis.senado.leg.br/legislacao/ListaNormas.action?tipo_norma=LCP&numero=000064&data=1990&SUBMIT1=Pesquisar>. Acesso em: 2 maio 2016.
[2] Anais do Senado, República, 1990, Livro 4, p. 1230. Disponível em: <http://www.senado.leg.br/publicacoes/anais/pdf/Anais_Republica/1990/1990%20Livro%204.pdf>. Acesso em: 2 maio 2016.
[3] id., p. 1555.
[4] id., p. 1568.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Brasil: TSE anula inelegibilidade por doação acima do limite legal


Leia notícia publicada em 08.11.2018 no site do TSE:

Entendimento adotado foi o de que a inelegibilidade só fica caracterizada quando o valor doado compromete o resultado das eleições

Em sessão realizada na manhã desta quinta-feira (8), o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acatou um recurso de Eduardo Peres (PV) e deferiu seu registro de candidatura ao cargo de deputado federal por São Paulo.
Ele concorreu em 2018 com o nome de urna ‘Dr Fernando’ e recebeu 660 votos, número insuficiente para se eleger. A decisão, contudo, confirma que o candidato não estava inelegível.
Durante a campanha, o Ministério Público Eleitoral (MPE) impugnou o registro de Eduardo Peres com base na alínea “p” da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010). A irregularidade estaria no fato de o candidato ter feito uma doação acima do limite permitido pela legislação eleitoral. A doação ocorreu nas eleições municipais de 2016, em benefício de uma candidata a vereadora no município de Jequié, na Bahia.
Segundo o MPE, o valor doado à época  – R$ 20 mil –  ultrapassou os 10% da renda do doador relativa ao ano anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997 – artigo 23, parágrafo 1º). Um total de R$ 7.835,85 teria excedido o limite permitido, razão pela qual o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) atestou a inelegibilidade do candidato.
Jurisprudência
Ao julgar o caso, o TSE fez prevalecer o entendimento assentado na jurisprudência da Corte de que se deve avaliar, caso a caso, se o valor em excesso comprometeu o resultado das eleições.
De acordo com o voto do relator, ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, o excesso da doação, por si só, “não esboça aptidão para comprometer a lisura do pleito”.
Segundo o magistrado, além de não ter sido eleitora, a candidata que se beneficiou da doação gastou valor inferior ao previsto legal naquele município baiano – R$ 32.913,02, em 2016. Além disso, não se teve notícia de investigação da doação feita pelo ângulo do abuso do poder econômico. Por essas razões, o ministro do TSE entendeu que “não existiu indicativo de ofensa à integridade do pleito”.
A tese foi corroborada pelos demais ministros da Corte, que se manifestaram no sentido de que não é qualquer doação que caracteriza excesso para fins de inelegibilidade. A decisão foi unânime.
CM/RT, DM

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

EUA: Consulta popular na Flórida aprova Emenda que restaura direito de voto de condenados que já cumpriram a pena


Na eleição da última terça-feira, os eleitores da Flórida aprovaram a Emenda 4 à Constituição estadual, permitindo que condenados por crimes graves que já cumpriram a totalidade da pena tenham restaurados seus direitos ao alistamento eleitoral e ao voto.
A questão é uma das mais polêmicas em matéria de direito de voto nos EUA. As disposições legais que impedem os condenados por crimes graves de se alistar como eleitores e de votar ou que dificultam o exercício desses direitos são conhecidas como felon disfranchisement (ou disenfranchisement) laws.
 Importantes ONGs de defesa dos direitos humanos têm combatido tais políticas, que terminam por privar do direito de voto majoritariamente afrodescendentes e hispânicos.
Segundo a ONG The Sentencing Project, em 2016, no país todo 6,1 milhões de pessoas estavam privadas do direito de votar em razão de uma condenação criminal. Esse número equivale a aproximadamente 2,5% da população em idade de votar – 1 em 40 adultos privados do direito de votar em razão de uma condenação criminal. Os 12 Estados que privam do direito de voto mesmo depois de cumprida a pena concentram 50% das pessoas privadas do direito de voto, isto é, quase 3,1 milhões de pessoas. O estudo revela ainda que os números variam enormemente de um Estado para outro, devido a diferenças na legislação ; em seis Estados – Alabama, Flórida (antes da mudança), Kentucky, Mississippi, Tennessee e Virgínia – mais de 7% da população adulta estavam excluídos do direito de voto.
Na Flórida a questão era especialmente grave, porque somente nesse Estado estavam concentrados mais de um quarto (27%) do total da população excluída do direito de voto no país; seus 1,5 milhão de pessoas privadas do direito de voto por condenação já integralmente cumprida equivaliam a quase metade (48%) do total nacional.
O estudo apurou que um em cada 13 afro-descendentes em idade de votar estavam excluídos desse direito, uma porcentagem mais de quatro vezes maior do que a de não afro-descendentes: 7,4% dos afro-descendentes adultos, em comparação com 1,8 dos não afro-descendentes. A exclusão dos afro-descendentes do direito de voto também varia enormemente de um Estado para outro. Em quatro Estados – Flórida (antes da mudança) (21%), Kentucky (26%), Tennessee (21%) e Virgínia, mais de um em 5 afro-descendentes estava privado do direito de voto (22%).
Matéria publicada em 2016 no jornal The New York Times sobre esse estudo enfatizou as diferenças existentes na legislação de um Estado para outro. O jornal apontou que as leis mais duras eram as da Flórida antes da mudança, de Iowa e da Virgínia, Estados onde a restrição ao direito de voto em razão de condenação penal se estendia pelo resto da vida, só podendo ser restaurado esse direito caso a caso por ato do governador ou decisão de um tribunal. O jornal assinalou que essas restrições têm uma longa história e baseiam-se na ideia de que aqueles que violaram as regras da sociedade não deveriam ter permissão para participar da elaboração delas. Quanto às disparidades raciais, cita a injustiça do sistema penal norte-americano, que faz com que os negros sejam condenados com mais frequência do que os brancos que cometeram o mesmo crime; a população encarcerada tende desse modo a incluir um número desproporcionalmente elevado de pessoas de baixa renda e minorias. O jornal sublinhou ainda outro dado do estudo: a maior parte dos condenados que não podem votar está fora da prisão. Por fim, a matéria evoca a eleição presidencial do ano 2000, que foi decidida por uma apertada margem de 537 votos na Flórida, quando estimadas 600.000 pessoas no Estado estavam privadas do direito de voto em razão de condenação a uma pena já cumprida.
Na opinião da ACLU (American Civil Liberties Union), importante ONG fundada em 1920, as normas que restringem o direito de voto em razão de condenação criminal não prejudicam apenas os que cumpriram penas e estão ávidos para contribuir para a sociedade – elas prejudicam a saúde da democracia, que precisa de mais participação e menos morte civil, razão pela qual essas pessoas deveriam ter seus direitos restaurados imediata e automaticamente.
É de notar que a Emenda 4, aprovada agora em consulta popular na Flórida, não restaura os direitos dos condenados por homicídio e crimes sexuais graves.
Apesar disso, matéria de ontem da revista Time informa que mais de um milhão de pessoas terão seus direitos ao alistamento e ao voto restaurados, número suficiente para decidir a eleição presidencial de 2020.


Referências:

EBENSTEIN, Julie. Time Served for a Non-Violent Drug Offense? Sorry, You Still Can’t Vote if You Live in Iowa. Disponível em: <https://www.aclu.org/blog/voting-rights/criminal-re-enfranchisement/time-served-non-violent-drug-offense-sorry-you-still>. Acesso em: 23 ago. 2017.

LAI, K. K. Rebeca; LEE, Jasmine C. Why 10% of Florida Adults Can’t Vote: How Felony Convictions Affect Access to the Ballot. The New York Times, 6 out. 2016. Disponível em: <https://www.nytimes.com/interactive/2016/10/06/us/unequal-effect-of-laws-that-block-felons-from-voting.html?mcubz=3>. Acesso em: 23 ago. 2017.

The Sentencing Project. Felony Disenfranchisement. Disponível em:  <http://www.sentencingproject.org/issues/felony-disenfranchisement/>. Acesso em: 22 ago. 2017.

WAXMAN, Olivia B. As Florida Restores Ex-Felons Right to Vote, Here’s the Dark History Behind Tehir Disenfranchisement. Time, 8 nov. 2018. Disponível em: <http://time.com/5448284/ex-felon-voting-rights-amendment-4-history-disenfranchisement/>. Acesso em: 9 nov. 2018.

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

EUA: Partido Republicano, inimigo do direito de voto


              Nesta eleição de meio de mandato nos EUA, o exercício do direito de voto em sua expressão mais elementar tem estado sob forte ameaça.
             Editorial do jornal Washington Post publicado no dia 31 de outubro resume bem o fenômeno.
            Ao longo da última década, por obra do partido Republicano em postos de poder no âmbito estadual, o exercício do direito de voto por norte-americanos pobres ou pertencentes a minorias raciais tem sido dificultado ao máximo, sob a falsa justificativa do combate à fraude eleitoral.
            O editorial começa por citar o Estado da Geórgia como protótipo do criador de dificuldades, com regras exageradamente restritivas do direito de voto. Assim, o Estado suspende do cadastro de eleitores nomes que não são grafados de modo idêntico em todos os bancos de dados do governo. Basta faltar um hífen ou outra mínima discordância para que o nome seja suspenso do cadastro de eleitores. E uma análise feita pela Associated Press concluiu que as minorias são as mais afetadas por essas medidas. Eleitores com o registro suspenso podem votar mesmo assim, mas podem ser levados a pensar que não podem.
            O Estado da Geórgia também possui regras estritas em matéria de identificação do eleitor, admitindo apenas uma lista reduzida de  documentos. Se não apresentar um desses documentos, o eleitor pode votar, mas o voto só será contado se em três dias do dia da eleição o eleitor apresentar um dos documentos exigidos.
            Em Dakota do Norte, o artigo aponta a existência de regras sobre a identificação do eleitor que ameaçam o direito de voto de nativos que vivem em reservas rurais sem um endereço com rua e número. Em New Hampshire o alvo são os estudantes, com a instalação de seções eleitorais para voto antecipado fora dos campi das universidades. No Alabama, há normas estritas sobre identificação do eleitor – mas também a possibilidade de reconhecimento do eleitor pelos mesários, o que dá margem a uma aplicação racista dessa exceção.
            No Kansas, conforme o editorial do Post, as autoridades eleitorais locais removeram a única seção de votação de Dodge City para bem longe da área central de sua crescente população latina.
            Desde 2013, quando a Suprema Corte invalidou o coração do Voting Rights Act,  houve o fechamento de centenas de seções eleitorais em todo o país.
            O artigo aponta que Estados como Iowa e Carolina do Norte reduziram o período de voto antecipado. Em junho deste ano, a Suprema Corte manteve uma lei de Ohio que exclui do cadastro de eleitores quem deixa de votar. Ao mesmo tempo, a Louisiana impede de votar as pessoas com suspensão condicional da pena (probation e parole). Na Flórida quem foi condenado por crime grave não pode votar mesmo depois de ter cumprido a pena integralmente.
            Mas o editorial assinala que há motivos para ter esperança. Na Flórida, por exemplo, a denegação do direito de voto aos condenados por crime grave vai ser agora submetida a consulta popular. Alguns Estados, como Oregon e Califórnia, têm facilitado o exercício do direito de voto. Melhores políticas no campo do direito de voto poderão ser adotadas por todo o país se as Casas Legislativas no âmbito estadual mudarem de mãos.
       Em conclusão, o editorial pergunta, uma vez que a fraude eleitoral é praticamente inexistente nos EUA, por que os Republicanos têm dificultado tanto o exercício do direito de voto no país 



Referência:

Editorial Board. Republicans’ great enemy: Voters. The Washington Post, 31 de outubro de 2018. Disponível em:  <https://www.washingtonpost.com/opinions/republicans-great-enemy-voters/2018/10/31/ef41db0a-dc77-11e8-b3f0-62607289efee_story.html?noredirect=on&utm_term=.106bfd9708d2>. Acesso em: 5 nov. 2018.




quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Brasil: Argumentos favoráveis e contrários ao monopólio partidário das candidaturas

Diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos e na França, em que as candidaturas avulsas são admitidas, a Constituição Federal brasileira de 1988 inclui entre as condições de elegibilidade a filiação partidária (art. 14, § 3º, V), instituindo o monopólio partidário das candidaturas.
 Historicamente, esse monopólio teve início no Brasil com o Código Eleitoral de 1945 (DL nº 7.586/1945, conhecido como Lei Agamenon), e não mais foi quebrado até os dias de hoje. Embora o anteprojeto que deu origem à Lei Agamenon tivesse mantido a permissão para as candidaturas avulsas, mediante requerimento firmado por duzentos eleitores, no texto final consagrou-se o monopólio. Isso porque prevaleceu o entendimento de que a exigência de um número reduzido de eleitores para a apresentação dos postulantes favoreceria a pulverização na escolha eleitoral e a dispersão dos votos.
Consolidou-se assim no Brasil a ideia da democracia pelos partidos, em que se vota não num candidato avulso, solto e independente, mas em alguém vinculado a um certo ideário político e a um programa de governo, passando os partidos políticos a intermediar e a organizar oficialmente as demandas da sociedade.
Mas, levando em conta a atual insatisfação da sociedade brasileira com os partidos políticos, e o envolvimento deles em escândalos de corrupção, em setembro de 2017 uma juíza da 132ª Zona Eleitoral de Aparecida de Goiânia autorizou o registro de uma candidatura sem filiação a partido político. Em janeiro de 2018, foi determinado que o TSE desenvolvesse softwares adequados à candidatura avulsa. Mas em 31.01.2018 o presidente do TRE-GO decidiu suspender essas decisões.
A propósito, a Lei nº 12.488, que integra o pacote de medidas da chamada reforma política de 2017, incluiu o § 14 no art. 11 da Lei das Eleições, dispondo que "é vedado o registro de candidatura avulsa, ainda que o requerente tenha filiação partidária".
Cumpre então evocar os argumentos favoráveis às candidaturas avulsas e os argumentos em sentido contrário, favoráveis à manutenção do monopólio partidário.
Os que defendem as candidaturas avulsas argumentam, em primeiro lugar, que atualmente a sociedade tende a se organizar em outros tipos de grupos, como ONGs e movimentos, e que os partidos teriam perdido a capacidade de representar a sociedade.
Em segundo lugar, seria vantajoso que ninguém precisasse permanecer filiado a um partido político apenas pelo fato de querer se candidatar.
Em terceiro lugar, sem o monopólio partidário das candidaturas, os partidos teriam que se desdobrar nas campanhas para sobreviver, com ganhos para a democracia
E com listas de apoiadores restritas à circunscrição onde se apresenta a candidatura, os custos da participação política seriam reduzidos.
E, por fim, as candidaturas avulsas estimulariam a participação política do cidadão, consolidando a cultura política e a própria democracia.
Por outro lado, os que defendem o monopólio partidário das candidaturas argumentam, em primeiro lugar, que a admissão das candidaturas avulsas só faria sentido em países com partidos fortes, como é o caso dos Estados Unidos e da França.
As candidaturas avulsas, registradas mediante apresentação de listas de assinaturas de apoiadores, concorreriam com os partidos, contribuindo para o seu enfraquecimento
Considerando que os partidos políticos têm a função, como dito, de representar um ideário político e defender a adoção de um programa de governo, de forma a intermediar as demandas da sociedade de forma organizada, não interessaria a democracia que os partidos fossem fracos.
Em segundo lugar, as listas de apoiadores das candidaturas avulsas terminariam por se comportar como partidos políticos, apenas sujeitas a menos restrições legais.
Na prática, seria uma forma facilitada de criação de partidos políticos, o que não favoreceria a democracia porque as exigências impostas à criação de partidos políticos asseguram que eles tenham ao menos um mínimo de legitimidade.
E os candidatos avulsos, sem acesso às formas de financiamento de campanhas de que dispõem os partidos, teriam que ser muito ricos, com capacidade econômica para custear a própria campanha, e tenderiam, uma vez eleitos, a defender interesses particulares de grupos economicamente poderosos, e não ideias e propostas comprometidas com o interesse público. 

Referências:

CARVALHO, André Norberto Carbone de. A democracia brasileira: Uma democracia pelos partidos ?, São Paulo, 2012. Disponível em : <http://tede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/1063/1/Andre%20Norberto%20Carbone%20de%20Carvalho.pdf>. Acesso em: 30 out. 2018.

Emenda quebra monopólio dos partidos políticos nas eleições. Jornal do Senado, 15 a 21 de junho de 2009.  Disponível em: <http://www.dpd.ufv.br/wp-content/uploads/DIR-130-CANDIDATURA-AVULSA-JORNAL-DO-SENADO.pdf>. Acesso em: 31 out. 2018.

MOURA, Rafael Moraes e PUPO, Amanda. Presidente do TRE-GO derruba decisão que autorizou candidatura avulsa. O Estado de S. Paulo, 2 de fevereiro de 2018. Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/presidente-do-tre-go-derruba-decisao-que-autorizou-candidatura-avulsa/>. Acesso em: 30 out. 2018.

PORTO, Walter Costa. Candidato avulso. In: Dicionário do voto, São Paulo: Giordano, 1995.