quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Brasil: Argumentos favoráveis e contrários ao monopólio partidário das candidaturas

Diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos e na França, em que as candidaturas avulsas são admitidas, a Constituição Federal brasileira de 1988 inclui entre as condições de elegibilidade a filiação partidária (art. 14, § 3º, V), instituindo o monopólio partidário das candidaturas.
 Historicamente, esse monopólio teve início no Brasil com o Código Eleitoral de 1945 (DL nº 7.586/1945, conhecido como Lei Agamenon), e não mais foi quebrado até os dias de hoje. Embora o anteprojeto que deu origem à Lei Agamenon tivesse mantido a permissão para as candidaturas avulsas, mediante requerimento firmado por duzentos eleitores, no texto final consagrou-se o monopólio. Isso porque prevaleceu o entendimento de que a exigência de um número reduzido de eleitores para a apresentação dos postulantes favoreceria a pulverização na escolha eleitoral e a dispersão dos votos.
Consolidou-se assim no Brasil a ideia da democracia pelos partidos, em que se vota não num candidato avulso, solto e independente, mas em alguém vinculado a um certo ideário político e a um programa de governo, passando os partidos políticos a intermediar e a organizar oficialmente as demandas da sociedade.
Mas, levando em conta a atual insatisfação da sociedade brasileira com os partidos políticos, e o envolvimento deles em escândalos de corrupção, em setembro de 2017 uma juíza da 132ª Zona Eleitoral de Aparecida de Goiânia autorizou o registro de uma candidatura sem filiação a partido político. Em janeiro de 2018, foi determinado que o TSE desenvolvesse softwares adequados à candidatura avulsa. Mas em 31.01.2018 o presidente do TRE-GO decidiu suspender essas decisões.
A propósito, a Lei nº 12.488, que integra o pacote de medidas da chamada reforma política de 2017, incluiu o § 14 no art. 11 da Lei das Eleições, dispondo que "é vedado o registro de candidatura avulsa, ainda que o requerente tenha filiação partidária".
Cumpre então evocar os argumentos favoráveis às candidaturas avulsas e os argumentos em sentido contrário, favoráveis à manutenção do monopólio partidário.
Os que defendem as candidaturas avulsas argumentam, em primeiro lugar, que atualmente a sociedade tende a se organizar em outros tipos de grupos, como ONGs e movimentos, e que os partidos teriam perdido a capacidade de representar a sociedade.
Em segundo lugar, seria vantajoso que ninguém precisasse permanecer filiado a um partido político apenas pelo fato de querer se candidatar.
Em terceiro lugar, sem o monopólio partidário das candidaturas, os partidos teriam que se desdobrar nas campanhas para sobreviver, com ganhos para a democracia
E com listas de apoiadores restritas à circunscrição onde se apresenta a candidatura, os custos da participação política seriam reduzidos.
E, por fim, as candidaturas avulsas estimulariam a participação política do cidadão, consolidando a cultura política e a própria democracia.
Por outro lado, os que defendem o monopólio partidário das candidaturas argumentam, em primeiro lugar, que a admissão das candidaturas avulsas só faria sentido em países com partidos fortes, como é o caso dos Estados Unidos e da França.
As candidaturas avulsas, registradas mediante apresentação de listas de assinaturas de apoiadores, concorreriam com os partidos, contribuindo para o seu enfraquecimento
Considerando que os partidos políticos têm a função, como dito, de representar um ideário político e defender a adoção de um programa de governo, de forma a intermediar as demandas da sociedade de forma organizada, não interessaria a democracia que os partidos fossem fracos.
Em segundo lugar, as listas de apoiadores das candidaturas avulsas terminariam por se comportar como partidos políticos, apenas sujeitas a menos restrições legais.
Na prática, seria uma forma facilitada de criação de partidos políticos, o que não favoreceria a democracia porque as exigências impostas à criação de partidos políticos asseguram que eles tenham ao menos um mínimo de legitimidade.
E os candidatos avulsos, sem acesso às formas de financiamento de campanhas de que dispõem os partidos, teriam que ser muito ricos, com capacidade econômica para custear a própria campanha, e tenderiam, uma vez eleitos, a defender interesses particulares de grupos economicamente poderosos, e não ideias e propostas comprometidas com o interesse público. 

Referências:

CARVALHO, André Norberto Carbone de. A democracia brasileira: Uma democracia pelos partidos ?, São Paulo, 2012. Disponível em : <http://tede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/1063/1/Andre%20Norberto%20Carbone%20de%20Carvalho.pdf>. Acesso em: 30 out. 2018.

Emenda quebra monopólio dos partidos políticos nas eleições. Jornal do Senado, 15 a 21 de junho de 2009.  Disponível em: <http://www.dpd.ufv.br/wp-content/uploads/DIR-130-CANDIDATURA-AVULSA-JORNAL-DO-SENADO.pdf>. Acesso em: 31 out. 2018.

MOURA, Rafael Moraes e PUPO, Amanda. Presidente do TRE-GO derruba decisão que autorizou candidatura avulsa. O Estado de S. Paulo, 2 de fevereiro de 2018. Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/presidente-do-tre-go-derruba-decisao-que-autorizou-candidatura-avulsa/>. Acesso em: 30 out. 2018.

PORTO, Walter Costa. Candidato avulso. In: Dicionário do voto, São Paulo: Giordano, 1995.