sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Brasil: Ministro do TSE defende critérios para candidatura sub judice


Leia matéria publicada ontem na revista Consultor Jurídico:

Por Gabriela Coelho
O ministro Tarcísio Vieira levantou um debate no Tribunal Superior Eleitoral sobre as hipóteses de aplicação do artigo 16-A da Lei das Eleições, que fixa os critérios para a permanência de um candidato na campanha eleitoral enquanto seu registro está sob avaliação, à luz de um entendimento recente do Supremo Tribunal Federal.
Para as eleições presidenciais, segundo a interpretação do TSE, os candidatos seriam impedidos a partir do momento em que o registro é negado por uma decisão colegiada do próprio TSE.
Em março, por maioria de votos, o STF entendeu que o legislador federal tem competência para instituir hipóteses de novas eleições em caso de vacância decorrente da extinção do mandato de cargos majoritários por causas eleitorais, porém não pode prever forma de eleição para presidente da República, vice-presidente e senador diversa daquela prevista na Constituição Federal. Na ocasião, o STF finalizou o julgamento das ADIs 5525 e 5619, que questionavam regras da minirreforma Eleitoral (Lei 13.165/15) sobre novas eleições em casos de perda de mandato de candidato eleito.
A discussão no TSE começou, na terça (25/9), na sessão que analisava o recurso ordinário de registro de candidatura de Thiago de Freitas Santos (PPL), que teve registro negado. Em uma questão de ordem, o ministro Tarcísio Vieira afirmou que o artigo 16-A alcança nova envergadura a partir do norte traçado pelo STF, que pontuou o marco executório das decisões que importem o indeferimento ou a cassação dos registros de candidatura pelo TSE.
Para candidatos a governadores e prefeitos, por exemplo, a norma não se aplicaria a partir do momento em que o registro for negado pelo TSE, que atuaria nesses casos como instância revisora de decisões proferidas nos tribunais regionais eleitorais. Nas eleições municipais, ficariam inviabilizados a partir do indeferimento do registro pelo TRE no acórdão do recurso eleitoral.
“Sob o prisma da renovação das eleições, assentou-se a possibilidade de execução imediata das decisões proferidas por este Tribunal Superior, independentemente do manejo de impugnações recursais outras”, disse.
Sobre o tema paradigma das eleições suplementares, o ministro destacou que não desconhece que os acórdãos condenatórios proferidos pelos regionais ensejam, em regra, o incontinente disparo de calendário eleitoral, de prazos enxutos, para chamamento dos eleitores às urnas, com vistas à realização de novas eleições, em referência aos cargos de chefia do Poder Executivo Municipal.
Para o ministro, é razoável entender que o indeferimento do registro pode – e deve – receber tratamento próximo daquele reservado à sua cassação, em exegese que, sob o enfoque do art. 16-A da Lei das Eleições, não se limite ao alcance vertical da cognição recursal, tendo em vista que, no âmbito dos registros de candidatura afetos às eleições gerais, o que diferencia a interposição do recurso especial e do ordinário, daí atraindo os pressupostos e contornos de cada uma dessas vias, não é o cargo almejado e em efetiva disputa, mas a matéria versada nos autos (o ordinário, nas causas de inelegibilidade, e o especial, nas condições de elegibilidade).
"A premissa deve projetar-se, na delimitação da condição sub judice do registro de candidatura considerada a necessidade e a pertinência de um duplo olhar que a um só tempo dê ao pronunciamento judicial maior assertividade e confira, na esfera da capacidade eleitoral passiva, dose substancial de segurança jurídica àquele que concorre e ao eleitorado que dele se socorre, de modo que o status sub judice, esvair-se-á não apenas pelo trânsito em julgado do decisum, mas, viabilizado o acesso à primeira instância ad quem, pelo seu pronunciamento, conforme decidir o relator na análise do caso concreto", disse. 

Municipais X Gerais

Assim, o ministro defende que nas eleições municipais, o candidato mantenha a situação sub judice do seu registro até a publicação, em sessão, do acórdão proferido pela Corte Regional no exame do recurso eleitoral e, se opostos, dos primeiros aclaratórios, por simetria ao que ocorre nas situações de afastamento de mandatário cassado, nas hipóteses de ocupante do cargo de vereador ou de prefeito e de vice-prefeito.
Nas eleições gerais, o ministro destacou que até o exame do caso pelo TSE como instância revisora, independentemente do recurso cabível (especial ou ordinário), dado que se está a prestigiar não a via processual, mas o duplo grau de jurisdição, assim compreendida como aquela prestada dentro da estrutura da Justiça Eleitoral, o que conduz ao passo seguinte: os registros julgados originariamente por esta Corte Superior não se acobertam do manto do artigo 16-A.
Nesse panorama, o ministro fez quatro ressalvas que considerou de destaque. A primeira é no sentido de não dar prazo à adoção de recursos desmesurados dirigidos à própria Corte de origem, a exemplo dos aclaratórios, com o fito de atrasar a inauguração da competência do Tribunal Superior Eleitoral.
“Por óbvio, não se cuida de presumir a má-fé processual, mas de estabelecer, em nome do bom direito e dos estreitos prazos do calendário eleitoral, que a oposição de segundos embargos de declaração na origem, desde que fundamentadamente declarados protelatórios, autoriza, excepcionalmente, seja, a partir de então, afastada a incidência da garantida materializada no art. 16-A da Lei das Eleições”, disse.
A segunda, de acordo com o ministro,  é a de que, na decisão monocrática confirmatória do indeferimento do registro de candidatura, possam, desde logo, a critério do relator, ser adotados os comandos ínsitos à imediata execução do que decido, projetando-se, para o primeiro pronunciamento plenário (exame inaugural ou do agravo interno), as situações nas quais se esteja a reverter registro deferido por TRE.
A terceira reside na possibilidade, a tempo e modo, de ser deferida medida liminar por órgão competente (singular ou colegiado), por meio da qual, na análise do caso concreto, inclusive de suas eventuais peculiaridades, seja assegurado ao candidato o prosseguimento na disputa eleitoral em sua plenitude.
“Em casos tais, prevalecerá o poder geral de cautela do magistrado, nos termos da legislação processual, ao menos até ulterior revisão do decisum, como forma de contornar eventuais iniquidades pontualmente verificadas. Nessa quadra, o poder geral de cautela do juiz demanda aplicação garantista, sobremodo no regime democrático em que erigida a ordem constitucional, sob pena de se acoimar a parte com o perecimento do seu direito”, explicou.
A quarta e última ressalva consiste em pontuar a ausência de afronta ao princípio da segurança jurídica na fixação dos parâmetros ora propostos. “Isso porque, do inteiro teor do voto condutor proferido nos embargos de declaração no REsp 139-25/RS, precedente por duas vezes citado neste voto, constou que “a edição da regra do art. 16-A da Lei das Eleições, que impõe a manutenção da campanha do candidato cujo registro foi indeferido até a apreciação da matéria por instância superior, converge no sentido de se aguardar o pronunciamento do Tribunal Superior Eleitoral, tal como ocorre no caso de aplicação do artigo 216 do Código Eleitoral”, disse.
Código Eleitoral

Em relação ao artigo 257 do Código Eleitoral, o ministro destacou que o legislador complementar fez inequívoca e legítima opção pelo duplo grau de jurisdição no que tange às decisões que resultem em cassação de registro, afastamento do titular do cargo ou perda de mandato eletivo, prevalecendo, quanto às demais deliberações, a regra geral de que os recursos eleitorais não são dotados de efeito suspensivo, mas, sim, meramente devolutivo.
Contudo, conforme reiteradamente decidido pelo TSE, sobremodo em questões jurídicas de maior relevo e impacto ao postulado democrático, a interpretação, em contextos tais, há de ser a sistemática, e não a textual (isolada).
Memorial

Na sessão desta quinta-feira (27/9), em memorial entregue ao TSE, os ex-ministros da Corte Henrique Neves e Fernando neves defenderam que os tribunais regionais eleitorais não podem vetar o direito de candidatos manterem atividades de campanha quando os seus registros forem negados e contestados judicialmente.

Esse entendimento foi aplicado ao TSE no julgamento que barrou a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e passou a ser replicado por tribunais regionais eleitorais.
“As referências feitas ao precedente do registro do ex-presidente Lula não são aplicáveis genericamente, pois a situação fática e processual do registro de candidatura para o cargo de Presidente da República é completamente diversa dos registros de candidatura para as eleições estaduais ou municipais”, destacaram os ex-ministros.
O memorial ressalta que, na eleição presidencial, o TSE possui competência originária, e contra a decisão da Corte só se admite a oposição de embargos de declaração e recurso extraordinário, o qual possui reduzidíssima amplitude.
Clique aqui para ler o voto do ministro. 
RO 060091968

Brasil: STF mantém normas sobre cancelamento de título de eleitor sem biometria


Leia notícia publicada ontem no informativo Migalhas:

Por maioria, plenário julgou improcedente ação ajuizada pelo PSB contra dispositivo e resoluções do TSE.

Em sessão plenária realizada nessa quarta-feira, 26, o STF, por maioria de votos, julgou válidas as normas que autorizam o cancelamento do título do eleitor que não atendeu ao chamado para cadastramento biométrico obrigatório. A decisão foi tomada no julgamento da ADPF 541, na qual o PSB pedia que o eleitor que teve título cancelado por faltar ao cadastramento biométrico fosse autorizado a votar. 
O partido solicitou que o Supremo declarasse não recepcionado pela CF/88 o disposto no parágrafo 4º do artigo 3º da lei 7.444/85 e, por arrastamento, os dispositivos das sucessivas resoluções do TSE que regulam a matéria. A maioria acompanhou o voto do ministro Luís Roberto Barroso, relator da ação, no sentido de indeferir o pedido da legenda. Ficaram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio.
Constitucionalidade do cancelamento
O ministro Roberto Barroso, em seu voto pela improcedência da ADPF, rebateu os argumentos jurídicos apresentados pelo partido. Em relação à alegada violação à democracia, à cidadania, à soberania popular e ao direito de voto, o ministro entendeu que todos esses direitos são assegurados pela CF/88 para serem exercidos na forma que o próprio texto constitucional estabelece. E, para o exercício legítimo do direito do voto, a Constituição (artigo 14, caput e parágrafo 1º) exige o prévio alistamento eleitoral, para que o eleitor possa ser identificado e para que se verifique se ele preenche alguns requisitos como, por exemplo, a idade.
O relator lembrou que o alistamento é feito uma única vez ao longo da vida, porém é necessário que haja revisões periódicas, tendo em vista que várias alterações podem interferir no direito de votar e na regularidade do título. “As pessoas mudam de domicílio, podem ser condenadas criminalmente, podem perder os direitos políticos, podem ser vítimas de fraude, há muitos casos de duplicidade de títulos e as pessoas também morrem”, ressaltou. Assim, ele considerou que é preciso haver um controle cadastral a fim de assegurar a higidez do direito de voto, ao observar que o funcionamento das revisões periódicas do eleitorado e a possibilidade do cancelamento de título estão previstos em lei.
Quanto à tese de violação da igualdade e da proporcionalidade, o ministro Luís Roberto Barroso explicou que o recadastramento não afetou desproporcionalmente os mais pobres e que a revisão eleitoral é precedida de ampla divulgação e da publicação de edital para dar ciência à população. Acrescentou que o procedimento é integralmente presidido por juiz Eleitoral, fiscalizado pelo MP e pelos partidos políticos e deve ser homologado pelos TREs.“Eventuais cancelamentos de títulos são objeto de sentença eleitoral, comportam recurso e permitem a regularização do eleitor a tempo de participar do pleito”, informou o ministro, ressaltando que os cancelamentos ocorrem até março do ano eleitoral, sendo possível regularizar os títulos até maio do mesmo ano.
Para o ministro, não há inconstitucionalidade no modo como a legislação e a normatização do TSE disciplinam a revisão eleitoral e o cancelamento do título em caso de não comparecimento para a sua renovação. Segundo ele, o TSE demonstrou “de uma maneira insuperável as dificuldades e impossibilidades técnicas, bem como o risco para as eleições de se proceder à reinserção de mais de 3 milhões de pessoas”.
Números
Em seu voto, o relator apresentou alguns dados sobre o tema. Segundo ele, entre 2012 e 2014, foram cancelados 2 milhões 290 mil e 248 títulos em 463 municípios. Depois de cancelados, foram reativados 1 milhão e 100 mil títulos, restando 1 milhão e 190 mil cancelados. No período de 2014 a 2016, foram cancelados 3 milhões e 15 mil títulos em 780 municípios e, posteriormente, foram regularizados 1 milhão e 396 títulos.
De 2016 a 2018, foram cancelados 4 milhões 690 mil títulos em 1.248 municípios e, em seguida, reabilitados 1 milhão 332 mil. Nesse mesmo período – de 2016 a 2018 –, 22 estados e 1.248 municípios foram atingidos por cancelamento de títulos.
Mérito
O julgamento começou com a apreciação do pedido de liminar, mas o relator propôs a conversão em julgamento de mérito, visando assim à resolução definitiva da questão antes das próximas eleições, que ocorrerão no dia 7 de outubro. A proposta foi acolhida pelo Plenário, vencido, neste ponto, o ministro Edson Fachin, que votou somente quanto ao pedido cautelar.
Seguiram o voto do ministro Barroso, no sentido de negar o pedido do partido, os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e o presidente da Corte, ministro Dias Toffoli.
O ministro Ricardo Lewandowski, em seu voto, abriu a divergência, entendendo que a providência adotada pelo TSE pode restringir “drasticamente” o princípio da soberania popular, previsto no artigo 14 da CF/88. Apontou ainda que o número de títulos cancelados impressiona e que isso pode influir de maneira decisiva nos resultados do pleito.
O ministro Marco Aurélio destacou que a Lei das Eleições apenas previu a possibilidade de adotar a biometria, sem prever sanção. “Vamos colocar na clandestinidade esses eleitores como se não fossem cidadãos brasileiros? Vamos colocar em primeiro plano as resoluções do TSE em detrimento da Lei Maior?”, questionou, votando pela procedência da ADPF.
Os ministros Celso de Mello e Rosa Weber não participaram do julgamento, pois declararam sua suspeição.

·         ProcessoADPF 541

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

EUA: PACs de liderança – escandalosos por natureza


Artigo publicado esta semana no jornal Washington Post joga luz sobre um aspecto escandaloso do financiamento eleitoral nos Estados Unidos: o gasto de dinheiro dos PACs de liderança com despesas pessoais dos deputados.
PACs de liderança são uma modalidade de Comitê de Ação Política (Political Action Committee), destinados, assim como os demais PACs, a arrecadar doações de simpatizantes e apoiadores.
Mas diferentemente dos PACs que estudei no livro e dos Super PACs, dos quais tratei aqui no blog, os PACs de liderança são criados por políticos que já ocupam cargo eletivo, notadamente parlamentares.
A finalidade inicial dessa modalidade de PAC foi a de arrecadar recursos para fazer doações de campanha a colegas que buscam reeleição, e com isso conseguir o voto e o apoio desses colegas para ocupar funções cada vez mais importantes dentro da Câmara dos Deputados, como a presidência de comissões e outros cargos.
Ocorre que, como demonstra o artigo, esse propósito original (ele próprio escandaloso) tornou-se obsoleto e cada vez mais os parlamentares utilizam os recursos arrecadados pelos seus PACs de liderança com despesas pessoais.
Nos EUA o uso de dinheiro arrecadado para campanha eleitoral com despesas pessoais é estritamente vedado e fiscalizado pela FEC (Federal Election Comission). Mas a lei e a prática da FEC são omissas quanto ao uso pessoal dos recursos arrecadados pelos PACs de liderança.
Por esse motivo, cada vez mais os deputados nos EUA esbanjam dinheiro arrecadado por seus PACs de liderança com despesas como férias, refeições, bebidas alcoólicas, roupas, locação de limusine e até consultas odontológicas.
Deputados alegam que despesas como viagens à Europa, férias em clubes de golfe, idas à Disneylândia e refeições em restaurantes de luxo são despesas necessárias para entreter grandes doadores de campanha. Atualmente eles preferem cativar grandes doadores de campanha do que  suas bases parlamentares.
Acontece, como aponta a articulista, que manter o foco em grandes  doadores de campanha prejudica o trabalho pelo interesse público, e constitui uma forma de corrupção. Ela assinala que os PACs de liderança tornaram-se um modo pelo qual os parlamentares desfrutam dos luxos que advêm da atividade de entreter grandes doadores.
Como conclui o artigo, não se sustenta a distinção que faz a lei entre dinheiro de campanha, cujo uso é sujeito a severas restrições, e dinheiro dos PACs de liderança. Fechar a brecha que permite aos parlamentares esbanjar com doadores e consigo próprios seria um importante passo de uma reforma do financiamento eleitoral nos EUA.

Referência:

CURRINDER, Marian. Leadership PACs are a campaign-finance scandal. Washington Post, 25 set. 2018. Disponível em: <https://www.washingtonpost.com/outlook/2018/09/25/leadership-pacs-are-campaign-finance-scandal/?utm_term=.1dcc32a3d8c0>. Acesso em 28 set. 2018.

terça-feira, 25 de setembro de 2018

Brasil: Partidos privilegiam candidatos à reeleição em divisão do fundo eleitoral

Leia matéria publicada hoje no jornal Folha de S.Paulo:


Critérios de distribuição de recursos vêm despertando debates e reclamações nas siglas

Felipe Bächtold
Catia Seabra

SÃO PAULO

A lista dos maiores repasses de campanha do fundo eleitoral indica apostas dos grandes partidos em herdeiros de linhagens políticas e em candidatos apadrinhados por lideranças das siglas. Mas são exceções em meio a um predomínio de políticos que tentam a reeleição como os donos das campanhas mais caras.
No PR (Partido da República), por exemplo, entre as primeiras posições na lista de repasses do diretório nacional estão as mulheres do senador Magno Malta (ES) e do ex-governador do DF José Roberto Arruda, que tentou concorrer em 2014 e foi barrado pela Ficha Limpa. Flávia Arruda e Lauriete Rodrigues receberam mais de R$ 2,3 milhões cada uma para financiar suas campanhas à Câmara.
Os critérios de distribuição de recursos vêm despertando acalorados debates internos das siglas e reclamações em série para as cúpulas. A fórmula de financiamento que estreia nesta eleição foi estabelecida após a proibição da doação de empresas, em 2015. Diante da falta de tradição das doações de pessoas físicas, no ano passado o Congresso aprovou a entrada em vigor de um bilionário fundo eleitoral para custear os gastos. 
Cada partido define como reparte a verba, mas há a obrigatoriedade de destinar 30% para candidaturas de mulheres. Os partidos com mais recursos são o MDB, com R$ 231 milhões, e o PT, com R$ 212 milhões.
No PT, entre os mais favorecidos via diretório nacional está a candidata a deputada federal Marília Arraes, que teve que retirar sua candidatura a governadora em Pernambuco após um acordo do partido com o PSB nacional. Neta do ex-governador Miguel Arraes, líder político histórico do estado, ela recebeu R$ 1 milhão.
No partido, a discussão sobre a distribuição se prolongou por toda a pré-campanha, gerou um debate no dia em que a candidatura do ex-presidente Lula foi registrada, em agosto, e acabou provocando a modificação de resoluções em três ocasiões. O partido ainda abriu um prazo de recursos para candidatos insatisfeitos, que foi até o último dia 17.
Em 2014, em média, cada deputado federal eleito gastou cerca de R$ 2 milhões em valores corrigidos pela inflação.
No MDB, despertou polêmica a decisão do diretório estadual do Rio de conceder R$ 2 milhões para a candidatura à Câmara de Danielle Cunha, filha do ex-deputado Eduardo Cunha, que está preso há quase dois anos na Operação Lava Jato.
A análise das contas partidárias reflete um padrão de repasses. As direções vêm investindo mais em mulheres que já são deputadas para cumprir a cota. No PSDB, só Aécio Neves (MG) entre os candidatos à Câmara recebeu o mesmo do que deputadas que buscam a reeleição --R$ 2 milhões cada.
Já os deputados federais que tentam a reeleição receberam cada um dos diretórios nacionais, até agora, R$ 1,5 milhão no MDB, a partir de R$ 720 mil no PT e a partir de R$ 500 mil no PSDB. Só depois começam a aparecer as candidaturas de nomes menos conhecidos. Os iniciantes geralmente recebem os repasses por meio de diretórios estaduais, com dimensões bem menores.
Entre os tucanos, um dos únicos candidatos não congressistas entre as campanhas mais caras é Lucas Redecker, deputado estadual no Rio Grande do Sul e também de família de tradição na política local.
Parte da cota do PSDB destinada a mulheres foi para a campanha de Ana Amélia Lemos (PP), candidata a vice-presidente na chapa de Geraldo Alckmin. A decisão envolveu negociações com deputadas que tentam a reeleição, que pleitearam maneiras de compensação.
No Partido Progressista, entre os 50 maiores beneficiários de repasses da direção nacional, há 27 deputados federais em busca da reeleição e dois suplentes. Um apadrinhado do ministro das Cidades, Alexandre Baldy, adotou como nome de urna "Adriano do Baldy" e recebeu R$ 1,9 milhão do partido em Goiás. Há também duas mulheres de lideranças do partido, o atual deputado federal José Macedo (CE) e o prefeito de Uberlândia (MG), Odelmo Leão. 
A campeã de repasses é Cida Borghetti, que concorre a governadora no Paraná e já recebeu R$ 6,9 milhões.
O tesoureiro do partido, o deputado federal Ricardo Barros, que é marido de Borghetti, diz que o partido decidiu privilegiar os deputados com mandato para conseguir manter uma bancada grande nos próximos quatro anos, já que a quantidade de eleitos na Câmara definirá a quantidade de recursos que a sigla terá de agora em diante e o tempo de TV nas eleições seguintes.
Segundo Barros, o partido criou critérios para ampliar ou reduzir a verba para candidatos à reeleição, de acordo com a votação em temas prioritários. Quem votou contra o fundo eleitoral em 2017, por exemplo, ganha menos. "Votou contra e ainda quer pôr a mão no dinheiro?", diz ele.
No DEM, com valores mais modestos de fundo eleitoral, o atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM) só recebeu R$ 100 mil da direção nacional do partido. 
No Pros, um dos maiores repasses foi para a mãe de Eurípedes Junior, fundador do partido, que é candidata a deputada federal em Goiás. 
Como as campanhas mais abastecidas tendem a ser de políticos mais conhecidos, já com mandato, a renovação do Congresso deve ser prejudicada.Com o poder das cúpulas partidárias, a nova lógica pode aproximar o sistema atual, de votação proporcional (em que o eleitor escolhe o candidato a deputado de sua preferência) ao modelo de lista fechada, que existe em outros países. Nessa outra fórmula, o eleitor vota no partido e as cúpulas dos partidos têm o poder de definir os primeiros da "lista" de eleitos.

Brasil: Como funciona a norma que procura barrar candidatos inexpressivos, por Eliana Passarelli*


Leia artigo publicado hoje no jornal Folha de S.Paulo:

Reforma eleitoral de 2015 estabeleceu uma votação mínima para eleitos

Em 2002, o candidato a deputado federal Enéas Carneiro, do extinto Prona, foi eleito com mais de 1,5 milhão de votos. A expressiva votação do médico que ganhou notoriedade com o bordão “Meu nome é Enéas” garantiu a sua vaga para a Câmara dos Deputados e elegeu outros cinco candidatos. A soma de quatro deles não atingiu 2.000 votos. Sendo que um teve 275 eleitores.
Para evitar esse tipo de anomalia, a reforma eleitoral de 2015 estabeleceu uma votação mínima para que candidatos inexpressivos nas urnas sejam “puxados”. Segundo a norma, estarão eleitos os candidatos “que tenham obtido votos em número igual ou superior a 10% do quociente eleitoral, tantos quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um tenha recebido”.
Em 2002, o quociente para deputado federal em São Paulo foi de 280.165 votos. Se essa regra vigorasse naquela época, o médico Éneas, falecido em 2007, não teria ajudado a eleger para o Congresso os cinco que foram beneficiados com seus votos. Nenhum deles atingiu os 10% (28 mil votos).O novo dispositivo dificulta a eleição de candidatos insignificantes, representantes de si mesmos, que pegavam carona na força de lideranças individuais. O que era uma minoria. Em São Paulo, por exemplo, nenhum dos 70 deputados federais foi eleito com menos de 10 % do quociente eleitoral em 2014.
Os cálculos para a distribuição das vagas começam com a definição do quociente eleitoral, que é a divisão do número de votos válidos (excluem-se brancos e nulos) pelo número de lugares a preencher em cada Estado. No primeiro momento, para participar do rateio, o partido ou coligação deve alcançar o quociente eleitoral. Em seguida, pega-se a soma da votação que o partido/coligação recebeu nominalmente e na legenda e divide-se pelo quociente eleitoral, o que resultará no número de cadeiras obtidas, o quociente partidário. A distribuição das cadeiras obedece à lista construída pelos eleitores por meio dos seus votos.  
Mas há uma novidade, aprovada em 2017, que merece destaque. As vagas não preenchidas, no primeiro cálculo, com a aplicação do quociente partidário e a exigência da votação mínima, serão distribuídas entre todos os partidos e coligações que participam do pleito, não importando se alcançaram ou não o quociente eleitoral. O rateamento dessas chamadas sobras, na segunda etapa, será feito por médias. Divide-se a votação recebida pelo partido/coligação pelo respectivo quociente partidário acrescido de um. Aquele que apresentar a maior média recebe a vaga, desde que tenha a votação mínima dos 10% do quociente eleitoral. Caso sobrem vagas e nenhum partido atenda à exigência da votação mínima, elas serão distribuídas para as maiores médias.
Raramente o eleitor entende a dinâmica da eleição proporcional e personaliza o voto, sem identificá-lo com partido ou coligação. É totalmente compreensível num cenário em que gravitam 35 partidos e inúmeras candidaturas, sendo que a maior parte das siglas não possui bases sólidas na sociedade civil. Há um outro aspecto da reforma de 2017 que busca o fortalecimento dos partidos políticos, vedando a formação de coligações nas eleições proporcionais. Isso valerá a partir das eleições de 2020. A iniciativa alia-se à cláusula de barreira, também aprovada em 2017, e que deve ser implantada, de forma gradual, a partir das eleições de 2018. O acesso aos recursos do fundo partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão dos partidos políticos dependerá do desempenho das agremiações nas urnas.
 
*Eliana Passarelli é ex-assessora de Comunicação do TRE-SP

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

França: Conselho Constitucional impõe inelegibilidade por contas de campanha não prestadas


O Conselho Constitucional francês julgou no dia 14 deste mês grande número de ações propostas pela Comissão Nacional das Contas de Campanha e dos Financiamentos Políticos (CNCCFP), relativamente à ausência de prestação de contas por parte de candidatos a deputado nas eleições de 2017.
Na França, a CNCCFP é competente para julgar as prestações de contas dos candidatos a deputado e, caso as contas não sejam prestadas ou, se prestadas, forem rejeitadas, deve determinar a perda do direito ao financiamento público (que na França se dá por meio de reembolso). Nesses casos, a CNCCFP deve recorrer ao Conselho Constitucional, requerendo a perda do mandato e/ou declaração de inelegibilidade. As contas de campanha devem ter sido certificadas por um perito contador, e devem estar acompanhadas dos comprovantes de entradas e saídas de dinheiro.
             Em parte dos casos julgados no dia 14, candidatos que deixaram de prestar contas alegaram estar desobrigados, por terem obtido votação inferior a 1% dos votos válidos; ocorre que ficou comprovado terem recebido doações de pessoas físicas para a campanha, o que os torna obrigados a prestar as contas; por essa razão, o Conselho Constitucional impôs nesses casos inelegibilidade por um ano para qualquer cargo.
            Na maior parte dos casos, os candidatos tiveram votação superior a 1% dos votos válidos, mas apresentaram um atestado de ausência de receitas e despesas, o que também os desobrigaria de prestar contas; ocorre que deixaram de apresentar os extratos bancários que comprovariam a veracidade dessa afirmação, razão pela qual o Conselho impôs também inelegibilidade por um ano para qualquer cargo.
            Nos casos em que os candidatos obtiveram votação superior a 1% dos votos válidos, mas deixaram de apresentar tanto a prestação de contas quanto o atestado de inexistência de receitas e despesas, a inelegibilidade foi imposta por três anos.
            Houve ainda candidatos que apresentaram a prestação de contas fora do prazo, alegando problemas de saúde e negligência do perito contador, o que também não teve o condão de afastar a imposição de inelegibilidade por um ano.

Brasil: MP Eleitoral contesta 2.636 candidaturas, um terço referente à Ficha Limpa


Leia matéria publicada no site Congresso em Foco em 18.09.2018:


Por Fábio Góis

O Ministério Público Eleitoral (MPE) pediu à Justiça nesta terça-feira (18) a impugnação de 2.636 registros de candidatura em todo país, que reúnem postulantes a cargos proporcionais (deputados) e majoritários (senadores, governadores e presidente). De acordo com o MPE, quase um terço dessas contestações (749 casos) se refere àqueles casos de inelegibilidade previstos da Lei da Ficha Limpa, legislação que teve origem na mobilização popular e está em vigor desde 2010.
O total de contestações de candidatura representa 9,1% dos 28.949 pedidos de inscrição para cargos majoritários e proporcionais. Além dos casos previstos na Ficha Limpa, há diversos tipos de contestação fundamentados em dispositivos legais que podem levar ao indeferimento de candidaturas.
O MP Eleitoral informa que, dos casos de impugnação com base na Ficha Limpa, 278 apontam condenações por órgão colegiado do Judiciário e 174 remetem a rejeições de contas públicas por Tribunais de Contas. No caso das contas rejeitadas, a detecção das irregularidades envolveu a parceria entre o MP Eleitoral e o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Contas, com apoio do Tribunal de Contas da União (TCU).
“A celeridade e a eficiência do MP Eleitoral têm sido enfatizadas pelas ferramentas de trabalho implementadas, pelos acordos de cooperação realizados e pelas ações em prol da unidade da atuação na matéria”, observa o vice-procurador-geral Eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros.
Além desses pedidos de impugnação de candidatura, o MP Eleitoral ajuizou 105 Demonstrativos de Regularidade de Atos Partidários (Draps), que relacionam candidatos de um mesmo partido postulantes às eleições proporcionais e majoritárias em determinada unidade da federação.
"A regularidade do Drap é pré-requisito para participação do partido na eleição. Entre os motivos para contestação, está o descumprimento da cota de gênero definido pela legislação eleitoral”, explica a assessoria do MPE, lembrando que a norma impõe a partidos ou coligações a reserva mínima de 30%, com máximo de 70%, para candidaturas de cada sexo.

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

EUA: Eleição primária é anulada em distrito da Geórgia por erro na distritalização


A situação que se vai descrever neste post é reveladora de um dos mais típicos inconvenientes do sistema majoritário uninominal (“distrital”) para a escolha de deputados.
No estado norte-americano da Geórgia, o resultado da eleição primária realizada em um dos distritos do estado para escolha do candidato do partido republicano a deputado estadual nesse distrito foi contestado em juízo pelo candidato que perdeu.
A eleição primária do partido Republicano no distrito realizou-se em 22 de maio e foi definida por uma diferença de 67 votos.
O referido pré-candidato alega que pelo menos 67 pessoas votaram no distrito errado por uma falha no processo de redistritalização (que se seguiu ao senso decenal de 2010), processo esse que divide os eleitores em distritos.
A questão foi levada a juízo, e, na data de hoje, a Justiça decidiu determinar a realização de nova eleição primária no distrito.
O juiz da causa declarou que como não se pode saber ao certo em quem votariam os 67 eleitores que votaram no distrito errado, a confiabilidade do resultado foi abalada.
A lei do estado da Geórgia determina que uma nova eleição seja realizada caso haja votos errados em número suficiente para por em dúvida o resultado da eleição.
Ao que tudo indica, a maior parte dos erros foi causada por complicações no processo de redesenho dos distritos. Em alguns casos, as linhas divisórias cortaram residências ao meio, e as autoridades eleitorais do condado decidiram arbitrariamente em qual dos distritos os habitantes dessas residências votariam.
Depois da primária de maio, autoridades eleitorais do condado de Habersham reconheceram seus erros e enviaram cartas aos eleitores declarando que os endereços deles haviam sido incluídos no distrito eleitoral errado.
Uma supervisora das eleições declarou ontem em juízo que cerca de 450 eleitores foram incluídos no distrito errado; dentre esses, 70 votaram na primária republicana em questão.
A empresa de processamento de dados que testemunhou em favor da tese do autor da ação afirmou que o problema ocorre no estado da Geórgia inteiro, e não apenas nesse distrito.
A nova eleição primária deve se realizar no dia 4 de dezembro, depois portanto das eleições gerais para governador e outros cargos, ditas eleições de meio de mandato, a se realizar em 6 de novembro.

Referências:

DEVINE, Curt. Georgia district is ordered to redo primary election after voting errors. CNN, 19 set. 2018. Disponível em: <https://edition.cnn.com/2018/09/18/politics/georgia-legislature-district-voting-election-errors-primary-republicans/index.html>. Acesso em 19 set. 2018.

EARLE, Sam. Georgia primary vote ruled void after remarkable ballot error. Newsweek, 19 set. 2018. Disponível em: <https://www.newsweek.com/georgia-primary-vote-void-after-remarkable-ballot-error-1128329>. Acesso em: 19 set. 2018.

NIESSE, Mark. Redo of Georgia House election ordered after voters cast wrong ballots. Politically Georgia, 19 set. 2018. Disponível em: <https://politics.myajc.com/news/state--regional-govt--politics/redo-georgia-house-election-ordered-after-voters-cast-wrong-ballots/P3r7UmYVpsOAZMQoBin9vI/>. Acesso em: 19 set. 2018.

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Brasil: Advogados comentam o precedente do TSE no caso Lula aplicado em cortes regionais


Leia matéria publicada na Revista Consultor Jurídico em 12.09.18:

Por Mariana Oliveira

O ministro Luís Roberto Barroso, no voto que indeferiu o pedido de registro de candidatura de Lula no Tribunal Superior Eleitoral, afirmou que o ex-presidente não poderia ser considerado candidato sub judice – ou seja, continuar na corrida eleitoral até que esgote todos os recursos possíveis na Justiça Eleitoral – porque o TSE vinha restringindo esse conceito ao longo dos últimos anos.
Para o relator, essa mudança no entendimento da legislação brasileira – uma vez que o artigo 16-A da Lei Eleitoral (9.504/97) permite que o candidato que ainda não teve seu registro indeferido em última instância efetue “todos os atos relativos à campanha eleitoral” – foi reforçada depois da Lei da Ficha Limpa, editada em 2010 para reformar a Lei das Inelegibilidades.
A Lei Complementar 135 diz que não podem ser eleitos os candidatos que tiverem sido condenados “em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado”. No caso de Lula, por exemplo, a condenação proferida em 2ª instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região trouxe a condição de inelegível utilizada para negar seu registro de candidatura e afastar a incidência do 16-A.
Antes, porém, os candidatos poderiam pedir a suspensão de sua inelegibilidade sustentando que sua condenação poderia ser reformada. Agora, disse o ministro, como a LC 135 dispensa a necessidade de todos os recursos estarem esgotados, “a exequibilidade da decisão no âmbito de processos de registro de candidatura ou de ações de investigação eleitoral deve ser imediata”.
Mas o novo entendimento de Barroso, utilizado em instância superior, começou a ser aplicado em tribunais regionais eleitorais, onde os políticos, em tese, ainda deveriam ter chances de apelar às cortes maiores. Na corte regional do Distrito Federal, a aplicação do novo precedente proibiu um candidato com o registro negado pelo Plenário de fazer campanha sob pena de multa diária de R$ 50 mil. 
Em Rondônia foram pelo menos três candidaturas indeferidas após a aplicação do entendimento do TSE nos julgamentos dos registros. Uma das negativas chegou a ser revertida na noite desta terça-feira (12/9), porque o ministro Jorge Mussi entendeu que somente o TSE pode proibir candidatos sub judice de fazer campanha.
"No caso do TSE tem fundamento porque é a última instância eleitoral", comenta Karina Kufa, advogada, coordenadora da pós-graduação em Direito Eleitoral da Faculdade IDP-SP e membro do Ibrade. "Já os TREs e as zonas não podem adotar o mesmo entendimento do ministro Barroso e afastar a aplicação do 16-A, já que cabe recurso e o índice de reversão pelo TSE é relativamente alto. O recurso extraordinário no TSE não tem efeito suspensivo e cabe apenas em alguns casos, quando há lesão à constituição", completou.
É a mesma preocupação levantada pelo advogado e ex-ministro do TSE Marcelo Ribeiro. Para o magistrado, o efeito da repercussão nos tribunais regionais e nos juízes — que podem tirar da disputa eleitoral candidatos com quadros possivelmente reversíveis nas instâncias superiores — levaria esses cidadãos a perderem o tempo da campanha eleitoral e saírem efetivamente da disputa. "Se você tira o sujeito da campanha agora faltando um mês da eleição e ele não consegue voltar, ele está eliminado", pondera. 
Ribeiro reconhece que havia dificuldade na posição do TSE em relação a Lula por se tratar da disputa à presidência. "Eu acho que deveriam ter deixado claro que aquele precedente só vale para o presidente da República dadas as peculiaridades do cargo", destacou o ex-ministro.
O advogado eleitoralista do Amazonas Yuri Barroso faz uma ponderação parecida. Ele sustenta que, apesar das possibilidades de recurso, o acórdão do TSE ganhou ares de definitividade porque "fez-se um esforço argumentativo pra dizer que, como se trata de registro de presidente, o caso é julgado em instância única".
Entre o posicionamento do advogado Daniel Falcão de que foi acertado o voto do Barroso no sentido de tirar a condição de candidato de um político condenado em segunda instância fazendo com que, para manter sua candidatura, ele tenha que "conseguir efeito suspensivo em seu recurso" e o entendimento da advogada Juliana Freitas, do Pará, que defende ser violação do devido processo legal "a antecipação do cerceamento do exercício" da candidatura, estão os argumento de Michel Saliba.
Eleitoralista há 26 anos, o advogado que foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Direito Político e Eleitoral (Abradep), afirma que o problema do 16-A é estrutural. Aplicando o artigo de forma literal, uma vez que ele está em vigor, ou deixando de aplicá-lo com base no precedente do ministro Barroso, nós enfrentaremos a mesma questão em 2020, durante as eleições municipais, sustenta Saliba. 
"Nós temos os registros de candidaturas aferidos no curso da campanha política, e aí está a grande deturpação no sistema eleitoral brasileiro", ressalta o advogado. "Nós teríamos que ter um registro avaliado com três meses de antecedência do início da campanha eleitoral, para não corrermos o risco de ter um candidato sub judice disputando eleição", defende.