Leia matéria publicada hoje no jornal Folha de
S.Paulo:
Critérios de distribuição de
recursos vêm despertando debates e reclamações nas siglas
Felipe Bächtold
Catia Seabra
SÃO PAULO
A lista dos maiores repasses de campanha do fundo eleitoral indica
apostas dos grandes partidos em herdeiros de linhagens políticas e em
candidatos apadrinhados por lideranças das siglas. Mas são exceções em meio a
um predomínio de políticos que tentam a reeleição como os donos das
campanhas mais caras.
No PR (Partido da República), por exemplo, entre as primeiras posições na
lista de repasses do diretório nacional estão as mulheres do senador Magno
Malta (ES) e do ex-governador do DF José Roberto Arruda, que tentou concorrer
em 2014 e foi barrado pela Ficha Limpa. Flávia Arruda e Lauriete Rodrigues
receberam mais de R$ 2,3 milhões cada uma para financiar suas campanhas à
Câmara.
Os
critérios de distribuição de recursos vêm despertando acalorados debates
internos das siglas e reclamações em série para as cúpulas. A fórmula de
financiamento que estreia nesta eleição foi estabelecida após a proibição da
doação de empresas, em 2015. Diante da falta de tradição das doações de pessoas
físicas, no ano passado o Congresso aprovou a entrada em vigor de um bilionário
fundo eleitoral para custear os gastos.
Cada partido define como reparte a verba, mas há a obrigatoriedade de destinar
30% para candidaturas de mulheres. Os partidos com mais recursos são o MDB, com
R$ 231 milhões, e o PT, com R$ 212 milhões.
No
PT, entre os mais favorecidos via diretório nacional está a candidata a deputada
federal Marília Arraes, que teve que retirar sua candidatura a governadora em
Pernambuco após um acordo do partido com o PSB nacional. Neta do ex-governador
Miguel Arraes, líder político histórico do estado, ela recebeu R$ 1 milhão.
No
partido, a discussão sobre a distribuição se prolongou por toda a pré-campanha,
gerou um debate no dia em que a candidatura do ex-presidente Lula foi
registrada, em agosto, e acabou provocando a modificação de resoluções em três
ocasiões. O partido ainda abriu um prazo de recursos para candidatos
insatisfeitos, que foi até o último dia 17.
Em
2014, em média, cada deputado federal eleito gastou cerca de R$ 2 milhões em
valores corrigidos pela inflação.
No
MDB, despertou polêmica a decisão do diretório estadual do Rio de conceder R$ 2
milhões para a candidatura à Câmara de Danielle Cunha, filha do
ex-deputado Eduardo Cunha, que está preso há quase dois anos na Operação
Lava Jato.
A
análise das contas partidárias reflete um padrão de repasses. As direções vêm
investindo mais em mulheres que já são deputadas para cumprir a cota. No PSDB,
só Aécio Neves (MG) entre os candidatos à Câmara recebeu o mesmo do que
deputadas que buscam a reeleição --R$ 2 milhões cada.
Já
os deputados federais que tentam a reeleição receberam cada um dos diretórios
nacionais, até agora, R$ 1,5 milhão no MDB, a partir de R$ 720 mil no PT e a
partir de R$ 500 mil no PSDB. Só depois começam a aparecer as candidaturas de
nomes menos conhecidos. Os iniciantes geralmente recebem os repasses por meio
de diretórios estaduais, com dimensões bem menores.
Entre
os tucanos, um dos únicos candidatos não congressistas entre as campanhas mais
caras é Lucas Redecker, deputado estadual no Rio Grande do Sul e também de
família de tradição na política local.
Parte
da cota do PSDB destinada a mulheres foi para a campanha de Ana Amélia Lemos
(PP), candidata a vice-presidente na chapa de Geraldo Alckmin. A decisão
envolveu negociações com deputadas que tentam a reeleição, que pleitearam
maneiras de compensação.
No
Partido Progressista, entre os 50 maiores beneficiários de repasses da direção
nacional, há 27 deputados federais em busca da reeleição e dois suplentes. Um
apadrinhado do ministro das Cidades, Alexandre Baldy, adotou como nome de urna
"Adriano do Baldy" e recebeu R$ 1,9 milhão do partido em Goiás. Há
também duas mulheres de lideranças do partido, o atual deputado federal José
Macedo (CE) e o prefeito de Uberlândia (MG), Odelmo Leão.
A
campeã de repasses é Cida Borghetti, que concorre a governadora no Paraná e já
recebeu R$ 6,9 milhões.
O
tesoureiro do partido, o deputado federal Ricardo Barros, que é marido de
Borghetti, diz que o partido decidiu privilegiar os deputados com mandato para
conseguir manter uma bancada grande nos próximos quatro anos, já que a
quantidade de eleitos na Câmara definirá a quantidade de recursos que a sigla
terá de agora em diante e o tempo de TV nas eleições seguintes.
Segundo
Barros, o partido criou critérios para ampliar ou reduzir a verba para
candidatos à reeleição, de acordo com a votação em temas prioritários. Quem
votou contra o fundo eleitoral em 2017, por exemplo, ganha menos. "Votou
contra e ainda quer pôr a mão no dinheiro?", diz ele.
No
DEM, com valores mais modestos de fundo eleitoral, o atual presidente da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM) só recebeu R$ 100 mil da direção nacional do
partido.
No
Pros, um dos maiores repasses foi para a mãe de Eurípedes Junior, fundador do
partido, que é candidata a deputada federal em Goiás.
Como
as campanhas mais abastecidas tendem a ser de políticos mais conhecidos, já com
mandato, a renovação do Congresso deve ser prejudicada.Com
o poder das cúpulas partidárias, a nova lógica pode aproximar o sistema atual,
de votação proporcional (em que o eleitor escolhe o candidato a deputado de sua
preferência) ao modelo de lista fechada, que existe em outros países. Nessa
outra fórmula, o eleitor vota no partido e as cúpulas dos partidos têm o poder
de definir os primeiros da "lista" de eleitos.