No
último dia 17 de setembro, o Supremo Tribunal Federal, em decisão histórica,
declarou inconstitucionais as normas que autorizavam a realização de doações de
campanha por empresas. Diversos fundamentos presentes na Constituição foram
invocados, mas podem ser destacados aqueles que negam às pessoas jurídicas a
titularidade de direitos políticos. Empresas não detém cidadania; não podem,
por conseguinte influir decisivamente nos pleitos eleitorais por meio do uso
das suas riquezas.
Chamam
a atenção, quando à fundamentação do julgamento (democracia, princípio
republicado, cidadania etc.), a sua condição de direitos fundamentais. Em suma
o STF concluiu que o financiamento empresarial de campanhas viola preceitos que
a própria Constituição trata como irrevogáveis ao assegurar-lhes a condição de
cláusulas pétreas.
Isso
implica dizer que, assim como pontuado pelo Min. Marco Aurélio de Mello, nem
mesmo uma Proposta de Emenda à Constituição pode reavivar a chama do dinheiro
empresarial desequilibrando os pleitos eleitorais.
Até
agora, segmentos numericamente diminutos vêm controlando com a sua fortuna a
sorte das candidaturas. Estudos recentes demonstram que os eleitos gastam onze
vezes mais que total despendido pelos derrotados.
Não é
de fato o empresariado brasileiro quem abastece as campanhas eleitorais, senão
um percentual irrelevante de megaempresas que se nutrem dos cofres públicos.
Empreiteiras, bancos e grande beneficiários de verbas do BNDES encimam as
listas de grandes doadores. Resultado: apenas 10 empresas financiaram as
campanhas de 70% dos deputados eleitos em 2014. Planos de saúde, universidades
privadas e outras instituições submetidas ao controle governamental de suas
atividades também estão entre os “generosos” campeões de verbas de
campanha.
Esse
fenômeno inibe a livre concorrência ao afastar as empresas em geral da
possibilidade de contratar com o governo. Além disso, facilita a concessão de
suborno a autoridades por formas lícitas, dificultando o trabalho dos órgãos de
fiscalização.
Por
outro lado, o argumento de que o fim do financiamento empresarial aumentará o
caixa 2 é pueril: parte da visão preconceituosa de que nosso empresariado é
composto por foras da lei. A maioria se deterá pela decisão do Supremo Tribunal
Federal de banir essa prática. Os segmentos não afetos à observância da lei,
minoritários, terão que se deparar com a norma penal em caso de persistirem na
conduta.
O
financiamento das campanhas deve estar a cargo dos próprios cidadãos, aos quais
a Constituição devota a titularidade do poder político.
A
política deve ser exercida pela cidadania. As empresas devem seguir na sua
imprescindível função de dar sustentabilidade econômica ao País, disputando em
condições de igualdade os contratos governamentais.
Felizmente,
a Lei das Eleições prevê um modelo plural de fontes de financiamento, onde a
participação individual dos cidadãos está contemplada. Assim é plenamente
possível obter verbas para campanhas num quadro de vedação de fontes empresariais.
Basta
que nos acostumemos a campanhas baratas - como sempre deveriam ser. A campanha
é a véspera do governo. Aquele que se porta de modo perdulário e haure seus
recursos em fundos de origem duvidosa não serão aqueles de quem poderemos
reclamar equilíbrio e boa governança.
Marlon
Reis é Juiz de Direito no Maranhão, um dos redatores da minuta da Lei da Ficha Limpa
Publicado originalmente no jornal O Popular,
edição de 27/09/2015.