Leia matéria publicada hoje no jornal Folha de S.Paulo:
Apesar de veto a contribuições empresariais, firmas
continuam a financiar campanhas por meio de seus proprietários e executivos
Ranier Bragon
Bernardo Caram
BRASÍLIA
O balanço das primeiras prestações de contas dos candidatos mostra
que empresários e políticos com patrimônio elevado continuam sendo os
responsáveis pela quase totalidade do financiamento das campanhas eleitorais.
Do total de R$ 45,6 milhões de grandes doações até agora —acima de R$
300 mil—, 93% saíram do bolso de concorrentes ricos (R$ 30,4 milhões) ou de
grandes empresários (R$ 12 milhões), com sobrenomes ligados a marcas como
Riachuelo, a rede de shoppings Iguatemi, Localiza e Porto Seguro.
A quantia que determina uma grande doação, acima ou igual a R$ 300 mil,
foi estabelecida pelo Tribunal Superior Eleitoral.
A
campanha começou oficialmente em 16 de agosto. Ou seja, os números tendem a
crescer muito até o final das eleições, em outubro.
O
Supremo Tribunal Federal proibiu em 2015 que empresas financiem as
campanhas sob o argumento de que a prática viola os princípios democráticos da
igualdade de forças na disputa, representando captura do processo político pelo
poder econômico.
Uma
reação comandada pelo Congresso, porém, abriu brechas para a manutenção do
status quo. Em uma primeira frente, deputados e senadores ampliaram o financiamento
público direto das campanhas instituindo um fundo de R$ 1,7 bilhão que é
distribuído aos candidatos a critério das cúpulas partidárias. E elas têm
privilegiado políticos já com mandato.
Em
uma segunda linha, barraram propostas que buscavam impor limite unificado a
doações de pessoas físicas ou ao autofinanciamento.
Isso
possibilita que empresas continuem doando por meio de seus donos ou executivos
e que candidatos ricos injetem altas somas em suas campanhas.
O
fundador do grupo que comanda a Riachuelo, Nevaldo Rocha, aparece no topo da
lista dos grandes financiadores, com R$ 2 milhões direcionados à campanha do
neto Gabriel Kanner (PRB), que disputa uma vaga de deputado federal em São
Paulo.
"Doei
esse valor porque acredito no meu neto e ele merece o meu apoio", disse
Nevaldo, por meio da assessoria de Kanner. O candidato afirmou que não
utilizará recursos públicos em sua campanha.
As
grandes doações de donos de empresas alcançam R$ 12 milhões nessa reta inicial
da campanha. O valor é quase oito vezes maior do que o montante recolhido até
agora pelas principais vaquinhas eleitorais. O mecanismo de financiamento
coletivo é usado pela primeira vez nas eleições deste ano e permite que
candidatos lancem plataformas na internet para arrecadar doações limitadas a R$
1.064 por dia, por doador.
Fundador
do grupo de tecnologia Positivo e candidato ao Senado pelo Paraná, Oriovisto
Guimarães (Pode) desembolsou R$ 1 milhão. Metade para a própria campanha,
metade para o presidenciável Alvaro Dias (Pode).
Dias
afirma que essa deve ser uma das poucas doações que vai receber. "É uma
doação espontânea que tem a ver com uma relação de muitos anos, de conhecimento
recíproco, de amizade e confiança no projeto politico."
Presidente
do Conselho de Administração do Grupo Jereissati, que controla a rede de
shoppings Iguatemi, Carlos Francisco Ribeiro Jereissati doou R$ 1 milhão,
metade para a reeleição do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e
metade para o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES).
O
senador afirmou que as doações que recebeu são espontâneas e dentro do que
determina a lei. O limite de doações para pessoas físicas é de 10% dos
rendimentos brutos do doador verificados no ano anterior à eleição. Maia não
respondeu.
O
empresário do ramo dos shoppings Carlos Amastha (PSB), por exemplo, sacou R$
1,45 milhão do próprio bolso para a campanha ao governo do Tocantins. O seu
vice, que também é um agropecuarista rico, colocou mais R$ 1,45 milhão. A Folha não
conseguiu falar com os dois.
Empresário
do ramo farmacêutico (União Química), Fernando de Castro Marques (SD-DF)
colocou R$ 1 milhão na própria campanha ao Senado e distribuiu outros R$ 800
mil a outros três candidatos, entre ele o candidato a governador Rogério Rosso
(PSD-DF), com R$ 700 mil.
A
assessoria de Marques afirmou que ele considera "absurdo" o uso do
fundo público de campanha e que o aporte do próprio bolso é porque irá
financiar toda sua campanha com recursos próprios.
A
regra eleitoral estabelece ainda que os candidatos podem usar recursos próprios
para financiar até o limite de gastos imposto ao cargo que concorre. No caso de
presidente da República, o teto é de R$ 70 milhões.
Como
é o exemplo do ex-executivo de banco e ex-ministro da Fazenda Henrique
Meirelles (MDB), que direcionou R$ 20 milhões do próprio bolso para sua
postulação ao Palácio do Planalto.