A ilustre advogada Fátima Nieto chama a
atenção para a modalidade contemporânea do voto censitário e para a renovação
da tradição brasileira que manda excluir
os pobres da política : a presunção de que toda doação eleitoral feita por
beneficiário do Bolsa Família é fraudulenta.
Fraudes
ocorreram, é certo, mas é de extrema gravidade para a saúde da nossa democracia
a consolidação da ideia de que quem recebe Bolsa Família não pode contribuir
para campanhas eleitorais.
Uma
vez mais, cria-se uma subcategoria de cidadãos.
Não
é de estranhar que se equiparem, como igualmente fraudulentas, as doações
feitas pelos mortos e pelos
beneficiários do Bolsa Família.
Onde
está escrito que quem recebe Bolsa Família não pode contribuir para campanhas
eleitorais ?
Não
são os pobres, justamente, quem mais paga dízimos às igrejas de todas as religiões
?
O
que se observa, nessa cruzada contra fraudes, é que entre as doações
“suspeitas” estão situações de legítima participação política, como aquela em
que um cidadão pobre, por exemplo, doa seu tempo para fazer uma panfletagem e o
candidato, querendo cumprir a legislação, lança na prestação de contas; ou até
mesmo doações em dinheiro de pequena monta.
O
que não se pode admitir é que, misturando joio com trigo, se excluam do
benefício do Bolsa Família cidadãos pobres só porque pretenderam exercer sua
cidadania plenamente.
Ao
alijar mais uma vez os pobres do processo político, com o pretexto de coibir
condutas fraudulentas, o que está por trás, na verdade, é o desejo de fazer
valer a tese de que os poderosos de sempre é que devem reinar soberanos em
matéria de financiamento eleitoral, e, com isso, retomar o financiamento de
campanhas por empresas.